Eles me entenderiam
Clarice me entenderia quando eu digo que descobri em mim mesma a felicidade, que tive a minha "Descoberta do mundo", nessas nossas conversas íntimas ela me dizia que a minha estrela iria brilhar em algum momento. A de todo mundo brilha em algum momento, basta mantê-la brilhante o máximo de tempo que conseguirmos. Machado me entenderia quando eu digo que não sei ao certo os motivos que me põe a caneta na mão e Tati Bernardi me aconselharia com voz imponente como fazia no auge dos meus quinze anos: Sofra, chore, mas espere O próximo. Melamed me aconselharia a criar e olhar com criatividade o mundo a minha volta, mesmo o que não estiver na minha esfera de influência, brincar com as palavras em meio ao caus. Acho que ele estaria orgulhoso agora. Ele me entenderia e me ajudaria a compreender o meu processo de "Regurgitofagia". Caio Fernando, tão meu sempre, me diria pra ter calma e espera com fé, talvez com um choro preso e um café quente toda noite, pra enfrentar melhor a madrugada e fazer companhia a tão amiga íntima agora, insônia. Ele diria, na falta de amor, café. Primeiro os morangos depois os mofos. Visto que na vida não deixarão de existir "Morangos mofados". Dalton Trevisan me diria que a "cada palavra, um beijo a menos", mas penso que na falta de beijo, muito tem me servido as palavras. Rubem Braga me faria um crônica, tenho certeza. E a Ana Cláudia Calomeni iria me lembrar de outros carnavais, de outras nossas-primeiras-músicas. Saramago me traria um "bom dia tristeza" e Cazuza sagaz como sempre diria "se doer demais é porque valeu", tia Rita- linda iria me lançar seus perfumes, suspender todos os jardins da Babilônia e me explicar o amor, o sexo. A professora mais linda de português que eu já tive na vida, tia Val, iria me olhar com carinho, passar as mãos no meu cabelo e pedir: respire. Não se apresse, eu te entendo, use vírgula, associe livremente as ideias, mas atente para a lógica, fundamentalize seu argumento. E sorriria dizendo um "vai ficar tudo bem" que me deixaria com os olhos cheios de lágrimas. Os bons escritores nem sempre de adaptam a métrica. Tia Val me entenderia. Beauvoir me ensinaria, mais uma vez, que a mulher não tem nada de frágil e ouviria atenta, minhas ânsias. O Árabe que escreveu o provérbio- árabe que dizia "Isso também vai passar" que eu não sei onde eu li, também me entenderia. Freud me entenderia, talvez eu nem precisasse de análise. O mundo talvez não, mas eles me entenderiam.