Loucura silenciosa em prosa

Faço das palavras de Nietzche as minhas: sou humana, demasiado humana.

A carência me alenta desejos insanos, o amor me inflama, o desprezo me mutila.Sou vítima de meus defeitos, minhas debilidades são assassinas.Minha crítica ao outro é meu reproche a mim mesma.Meu sorriso disfarça os meus enganos in(e)ternos.

O sentimento de inadequação irá acompanhar-nos permanentemente, em um eterno jogo de encaixa, em um constante aparar de arestas.A vida sempre será este mistério oco, essa loucura institucionalizada.Nunca irei me acostumar a esta surrealidade.Pensamentos transcendentes me perseguem.A bondade afaga minha alma, o mal traz o breu.

Muitas vezes, sinto a vontade de escrever o que sinto, depositar em celulosa o que delineia-se em minha mente.Mas - ou as palavras são insuficientes ou o meu vocabulário não é preciso - nenhuma explanação verbal beira a reflexão imaginada.Para evitar o fracasso, engano-me descaradamente, escondendo canetas e papéis, ocupando freneticamente minhas horas, certificando-me de eliminar todos os resquícios de ociosidade, sufocando o grito que insiste em eclodir.Quero ser como a menina que trabalha na fábrica de jeans e, de tanto dobrar calças, esquece-se da poesia.Às vezes, a ignorância é uma benção.Meu sonho de consumo...não!

Outras tantas vezes, engrandeço-me com a perspectiva do novo, com o mundo de possibilidades.Mas a covardia me apequena, a visão do obscuro apunhala meus anjos sorridentes.Tudo é vasto, mas a felicidade é minimalista, é portinhola frouxa, entreaberta, discreta, de vidrilho trincado.

O porvir sempre será meu vislumbre.A dúvida sempre será minha companheira de debulhos e dentes à mostra.Devo acostumar-me, prometo esforçar-me.Ser ou não ser.Ser sendo.Sem sem ser.Querer ser sem querer.Não ser querendo.Mas ser.Sempre.

Giuliane Lorenzon
Enviado por Giuliane Lorenzon em 09/12/2013
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