SOBRE VIAGENS E DESAFIOS
Sempre que digo que viajo sozinha, as pessoas perguntam “você não tem medo?”. Antigamente eu costumava responder que não, quando na verdade eu morria de medo. Não era minha intenção mentir, mas provavelmente fortalecer a mim mesma, ou seja,eu não admitia, nem para mim, que tinha medo. Hoje eu admito: sempre dá um medinho...
No começo eu fiquei mesmo foi apavorada! Eu estava saindo de uma fase difícil em que tive crises de pânico, inclusive de avião. Minha primeira viagem solo foi um marco. O destino escolhido foi Bonito-MS. Sim, pensei em desistir. Sempre me considerei corajosa, mas por outro lado, sempre tive umas minhocas na cabeça, de achar que coisas ruins aconteceriam comigo (porque algumas realmente aconteceram). Quando eu entrei no avião para essa primeira viagem solo e não tive medo na decolagem, até chorei. Ainda fiz uma conexão em Curitiba, antes de ir para Campo Grande. Claro que eu me cerquei de garantias. Reservei o Hostel (também nunca tinha ficado em um e adorei!) e o transfer do aeroporto de Campo Grande para Bonito. Até os passeios reservei antes e deixei pago. Isso foi num feriado de Corpus Christi.
Logo na primeira noite, no hostel, fiz varias amizades e, pouco depois de ter chegado à cidade, lá estava eu: no barzinho com meus novos amigos, brasileiros de todos os lugares. Todos os dias fiz passeios incríveis e conheci pessoas maravilhosas, que fazem parte da minha vida até hoje. Uma dessas amigas, a Eliane, tornou-se companheira de outras viagens. Uma outra coisa interessante é que passei muito frio em Bonito! Passar frio num lugar onde as pessoas costumam morrer de calor é uma dessas coisas genuinamente maravilhosas que acontecem nas viagens. Tinha levado só dois casaquinhos e os usava o dia todo e inclusive para dormir! Rsrs. Isso me fez perceber que, na verdade, a gente precisa de bem pouco pra viver!
A viagem terminou e foi simplesmente incrível! Me senti totalmente abençoada pela oportunidade.
O medo passou? Claro que não! E por isso e apesar disso eu resolvi continuar viajando. Minha segunda viagem solo foi para Santiago do Chile. Meu maior medo, além do avião cair, claro, era ficar sozinha. Eu até gosto de ficar sozinha, ou achava que gostava, mas rolava um medinho de, na hora h, em que eu estivesse mesmo só, iria odiar. Bom, as duas melhores partes: não, eu não odiei e, na verdade, fiquei bem pouco tempo sozinha. Conheci uma nova amiga ainda na conexão em Montevidéo, a Maria. Acabei mudando de hostel para ficarmos juntas, já que ela havia pago a reserva e eu não. Foi ótimo, fizemos tudo juntas e eu não deixei de valorizar alguns momentos de solidão ou valorizar ainda mais esses momentos...
Uma coisa interessante aconteceu no voo de volta da conexão de Montevideo para São Paulo. Estava voando com a falecida Pluna (companhia uruguaia). Faltando uns 40 minutos para pousarmos em Guarulhos, o piloto avisa que teríamos que voltar para Montevideo, em razão de um “problema técnico” no avião. Esse é tipo de situação que você para e pensa: estou tendo um pesadelo, isso não está acontecendo. Mas estava. E nessa hora eu pensei, como outros devem ter pensado, que havia mesmo um problema técnico e que o avião iria cair. Rezei. Pedi a Deus que, se fosse o caso, me acolhesse da melhor forma. E também pensei na diferença entre o aeroporto de Montevideo e o de Guarulhos, a única era que em Montevideo havia o mar Del Plata. Talvez fossemos pousar na água e eu descobriria se os assentos realmente flutuam. O mais interessante é que, com tudo isso, eu não perdi a calma um instante sequer. No fundo, a gente não acha que vai mesmo morrer. Cheguei a perguntar para a comissária com toda a calma do mundo se o problema técnico nos impediria de pousar (ou seja: vamos morrer?). Ela me assegurou que não, que estava tudo bem, mas eu tinha total consciência que talvez nem ela soubesse o que estava dizendo. Enfim, o grande “problema técnico” eram uns 6 coreanos que estavam no voo e, por alguma razão que desconhecemos, não tinham autorização para pousar em Guarulhos. Incompetência de Pluna que, aliás, não forneceu informações, nem refeições, nem nada, só uns amendoins e um copo d’água, inclusive para as mulheres grávidas e crianças do voo. Alguma tempo depois, a companhia faliu...dá pra entender o porquê
O fato é que eu desembarquei vivinha da silva, não às 22:00 hrs, mas às 2:00 da manhã, em Guarulhos. Exausta, mas feliz!
A terceira viagem solo foi para o Peru. Eu estava de novo com medo de tudo. Reservei hostel e passeios em Machu Picchu. Chegando ao aeroporto, peguei um taxi e fui para o hostel. Cheguei no hostel querendo fazer amizades, mas dessa vez não foi tão fácil. Era um hostel grande, o que dificulta um pouco o contato com as pessoas. Havia um grupo grande de brasileiros, mas todos em um congresso de arquitetura, ou seja: eu não tinha nada em comum com eles. Detalhe: eu falo bem o inglês e me viro no espanhol, mas confesso que ainda tenho esse tabu de fazer amizade com gringos. Outro desafio que preciso vencer. Depois de alguns dias, conheci uns brasileiros e fui pra Machu Picchu com eles, mas não fiquei grudada em ninguém e, quer saber? Foi bem legal também. Andar sozinha pelas ruas de Cusco foi uma bênção!
Numa das cidades em que fiquei, Puno, fui roubada no hotel (tiraram 100 soles da minha carteira enquanto tomava café da manhã) e, além disso, fiquei bem doente. Às vezes, as viagens têm coisas chatas. Peguei uma virose que soltou meu intestino e minha pressão caiu, eu mal ficava em pé! Aliás, era pra eu ter conhecido um cemitério inca, mas eu decidi ficar dormindo na Van. No fim daquele diz, passei umas três horas na rodoviária de Puno, esperando o ônibus para voltar a Cusco. Foram as três horas mais longas da minha vida, rsrs! Comprei duas mantas, pois tremia de frio e febre. Me enrolei toda e dormi pesado no ônibus. Quando cheguei a Cusco, a febre havia passado. Mais uma lição eu aprendi nessa viagem: a gente pode não gostar de todo lugar que conhece. Cidades são como pessoas, algumas a gente se dá bem logo de cara, outras a gente não topa! Rsrs. Detestei Puno!
A viagem terminou e, mesmo controlando o pânico da volta (talvez um mini trauma por causa daquele voo da Pluna), deu tudo certo de novo!
Depois disso, viajei solo para Maceió e foi novamente maravilhoso. Fiz muitos amigos. Não vou contar todos os detalhes de novo, o texto já está longo! E também fui para Punta Del Este, essa foi a viagem mais solitária que fiz e gostei bastante! Aprendi mais sobre mim mesma nessas viagens, inclusive que adoro estar só! Conheci ainda o Atacama, uma viagem inesquecível e quase espiritual para mim.
Agora vou falar da viagem mais recente: Patagônia Argentina. Foi fantástica! E o melhor: pela primeira vez eu entrei num avião com a certeza de que ele não ia cair (eu sempre tinha certeza que ia morrer, rsrs)!. E a viagem foi bem leve. Continuo reservando o hostel com antecedência, mas dessa vez, chegando na primeira parada, a cidade de El calafate, eu perguntei o que tinha para fazer na cidade. Fiquei sozinha no quarto do hostel e foi divino! E fiz uma trilha sozinha em El Chalten e tenho certeza que, nesse dia, eu estava bem mais perto de Deus! Me senti totalmente conectada com a natureza e abençoada! Ainda voei para Ushuaia (dessa vez deu um medinho, mas o avião passa literalmente no meio das montanhas, rsrs). A estada em Ushuaia foi maravilhosa, fiz amizade com uma turma incrível de brasileiros, fora os estadunidenses, indianos, franceses, gente do mundo todo...que conheci!
Essa foi a viagem mais tranquila e onde eu tive apenas a certeza de que, enquanto a vida permitir, vou viajar, conhecer, me aventurar...e mesmo que eu tenha medo, eu vou superar, porque viajar não é algo que eu faço ocasionalmente, é a minha essência.