E ÁLVARO DE CAMPOS PERGUNTA:

NO INÍCI0 DA MADRUGADA DE 24 DE SETEMBRO DE 2013

E ÁLVARO DE CAMPOS pergunta, no poema LISBON REVISITED, de 1923:

“Que mal fiz eu aos deuses todos?”

Eis seu poema, na íntegra:

" LISBON REVISITED - ÁLVARO DE CAMPOS"

(1923)

"Não: não quero nada.

Já disse que não quero nada.

Não me venham com conclusões!

A única conclusão é morrer.

Não me tragam estéticas!

Não me falem em moral!

Tirem-me daqui a metafísica!

Não me apregoem sistemas completos, não me enfileirem conquistas

Das ciências (das ciências, Deus meu, das ciências!) —

Das ciências, das artes, da civilização moderna!

Que mal fiz eu aos deuses todos?

Se têm a verdade, guardem-na!

Sou um técnico, mas tenho técnica só dentro da técnica.

Fora disso sou doido, com todo o direito a sê-lo.

Com todo o direito a sê-lo, ouviram?

Não me macem, por amor de Deus!

Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?

Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa?

Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.

Assim, como sou, tenham paciência!

Vão para o diabo sem mim,

Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!

Para que havemos de ir juntos?

Não me peguem no braço!

Não gosto que me peguem no braço. Quero ser sozinho.

Já disse que sou sozinho!

Ah, que maçada quererem que eu seja da companhia!

Ó céu azul — o mesmo da minha infância —

Eterna verdade vazia e perfeita!

Ó macio Tejo ancestral e mudo,

Pequena verdade onde o céu se reflete!

Ó mágoa revisitada, Lisboa de outrora de hoje!

Nada me dais, nada me tirais, nada sois que eu me sinta.

Deixem-me em paz! Não tardo, que eu nunca tardo...

E enquanto tarda o Abismo e o Silêncio quero estar sozinho!"

Como quisera não entender-te, Poeta! Como eu o quisera, mas, sempre pergunto contigo, eu, esta poeta de 5ª, esta ínfima:

“Que mal fiz eu aos deuses todos?”

que mal fiz eu...

`A guisa de algum conforto eu, Zuleika, escrevo-me estas trovinhas:

Se julgam sem me saberem

que posso eu fazer, que posso?

Se contaminar-me querem

darei a ninguém o troco.

Seguir livre ninguém segue

neste mundo de oprimidos.

Se a consciência consegue

guiar-me os passos perdidos

mesmo em meu erro acudir-me,

que eu não me sobrecarregue

de julgamento a ferir-me.

Haja um Deus que me preserve.

Abraço grande, amigos queridos do Recanto das Letras. Até breve.

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