Imaginação Funérea
Entre as vozes que lamuriam canções tenebrosas em minha mente, perco-me nos recônditos caminhos de mim mesmo, e crio mundos utópicos de histórias melancólicas que são exteriorizadas entre as linhas fúnebres de meus textos. Hoje, mergulhado no pélago incognoscível da consciência, forço a imaginação e encontro-me diante a mim mesmo na solidão vivaz da fria escuridão do não-ser, soterrado na telúrica negridão das profundas sepulturas. A imaginação abre portas para o teatro nefando, e vejo-me sob a luz do plenilúnio, rodeados de lápides as quais, pela luz da lua, luzem suavemente as almas que ali descansam em paz. Olho-me deitado entre as flores mortas, de face serena voltada para refulgência das estrelas. O vento sopra o augúrio num lamurio profundamente perturbador, como se as almas que descasavam em paz despertassem de seu sono profundo e reivindicassem o direito à morte, negando assim, a vida que lhes tira o cobertor, perturbando-os com a brisa gélida da madrugada.
A lua me observa sorrateiramente das alturas. Ao longe ouço os corvos, carniceiros da morte, cantarem em louvor à morte. O vento cessa seu lamurio e a quietude da noite engole todo o cemitério, envolvendo-me no silêncio que fere os ouvidos, como se gritasse mais do que mil bocas.
De tumba aberta, vejo-me à companhia dos vermes sorrateiros, que dançam em minha matéria fétida, a canção da podridão de tudo quanto é morto. Sinto fisgar no peito uma angustia que diluem em ânsias os pensamentos que vomitam simbolicamente, a bílis amarga dentro de minha própria boca. É a tortura lastima de ver a si próprio reduzido à putrescência em que todas as coisas se reduzem.
À noite torna-se rubro, e vejo escorrer da lua o sangue fervente de todas as espécies sofredoras. É a natureza chorando em lágrimas escarlates sobre minha sepultura, torturando, mesmo depois morto, minha carcaça com o sofrimento infindo que carreguei em vida. Tamanha dor que carregastes no peito, como Jesus carregou sua cruz até o calvário, eu carrego a tristeza universal que transcende o corpo físico, que continua a entristecer-me até mesmo depois da morte... O sangue escorre pelo cemitério caindo em minha tumba, mergulhando meu corpo vão adormecido no líquido que simboliza a tristeza que não coubestes em meu corpo vivo. Aquilo tortura-me profundamente, então viro as costas e rumo de volta ao mundo real, e quando estou prestes a abrir o olhos, escuto, quase inaudível, minha alma lamuriando em prantos por ter sido acordada de seu sono profundo...
Abro olhos e fito aquilo que parece ser o teto, mas minha visão está voltada para os vestígios de imaginação do velório de mim mesmo. A voz de minha alma despertada pela dor ainda sussurra dentro da cabeça. Sinto o medo percorrer pelas veias, pois, por alguns segundos, tive a sensação de que esta vida é somente o despertar de uma alma sórdida que ainda não chegou até o calvário da paz.
Melhor começar imaginar outras coisas...