A SAUDADE É FEITA DE AUSÊNCIAS
Na verdade tenho medo de ser saudosista, me policio para não ser um deles.
Quando vejo um "antigão" começando a falar: - "No meu tempo...!" - Xii, lá vem saudosismo! Todo tempo é um Tempo. Com sua roupagem, com suas tramas, com seus falares. Ninguém fala mais: "supimpa", mas era palavra na "boca da moda". Ninguém põe o nome de Boanerges, Teófilo (Teophilo) Aureliano, Gertrudes, Castorina, Tereza Joaquina, Normandia, Ubaldino, etc.
Os tempos mudam (tempus fugit) as saias das mulheres arrastavam o pó das ruas descalças e poeirentas; ostentavam chapéus, toucas...! Os homens com aquele calor do Rio antigo, como dizem nossos bons amigos portugueses, todos de "fato" (terno), gravata borboleta e chapéu ou cartola. Colarinho engomado, e notem, ternos de casimira inglesa, grossa como manta de lã (visto que na Bretanha neva e faz frio) e pior, de colete por baixo. Pobres coitados daqueles que queriam andar na moda ou arrancar suspiros das moçoilas.
Pois é, saudosismo para quê! Saudades de ir buscar lenha no mato como nossas avós e conforme a nossa idade, até mesmo nossas mães, quando adolescentes ou crianças? Fogão de lenha, hoje é chique ter um na chácara, mas quero ver ter um dentro de casa, com aquele fumacê, enchendo o tellhado de picumã (fuligem grudada nas teias de aranha, preta que nem carvão) e ainda havia quem pusesse picumã nos ferimentos das pessoas e crianças, para estancar o sangue e cicatrizar. Na minha família, minha avó, Dona Chiquinha (Francisca Pinheiro de Camargo Martins), cabocla, tentava pôr picumã em nós. Meu pai, socorria, pegava logo o guri e usava a "pedra-ume" que sempre tinha numa gaveta, depois de limpar o machucado com álcool puro. A gente pulava e gritava, sapateava de dor e ele não largava até fazer o curativo: à "moda gaúcha" dele.
Outra coisa que não faltava era o fungo, que parecia uma esponja grande. Apertado, soltava um pó amarelo em cima do ferimento que estancava na hora o sangue. Era pura penicilina em natura!
Então, queremos tudo isso de volta? De minha parte digo, "é claro que não!". Temos hoje tudo à mão. Luz, (antes lamparina e velas, lampião era luxo de quem podia) o nariz da criançada e de todos, amanheciam pretos nas narinas. Era de respirar a fuligem do pavio queimado.
Hoje a energia elétrica é o cérebro e o coração do mundo. De um motorzinho de aquário à medicina avançada.
A água, era de poço, tinha que ser tirada na manivela do "cambote" que enrolava a corda e puchava o balde, ou então era no "muque" puxando a corda que passava em uma carretilha de ferro. Hoje, jorra nas torneiras internas e nos luxos mais supérfluos.
Enquanto o banho era de caneca com a pessoa em pé numa bacia grande ( que chamavam baciona) a mãe esfregava sabão (de lavar roupa, feito em casa) com bucha. Arranhava que era uma desgraça. Por isso é que as crianças queriam fugir do banho. Era um sacrifício de pagar os pecados!
Voltando ao início, é por isso que não dá para ouvir saudosistas contarem seus "causos".
Existem os "causos" dignos de serem escritos, lidos e recontados é claro. Bem interessantes, brilham como vagalumes (que já estão quase extintos, ou extintos não sei, pois não os vejo mais). Mas sendo como: "causos"; que quase acabei contando sem querer. E não desta forma: - "no meu tempo é que as coisas eram boas etc e tal".
Tive um colega na Academia Guaçuana de Letras, grande cronista com dois livros editados e outros por editar com centenas de crônicas nos jornais; que atingiu seus 87 anos de vida.
Pouco antes de falecer, nos corredores da Faculdade "Imaculada", que nos levam ao local de nossas reuniões, ele citou-me em meio a uma conversa literária, que: - "É terrivel o velho saudosista"; continuou ele (com sua voz suave) : - "com esse sujeito então, (dizia) é melhor desconversar ou trocar de parceiro de prosa". Imaginem, 87 anos com essa visão!
Pensei: - Não quero isso para mim. Saudosismo não!
Saudosismo segundo o Aurélio é a valorização demasiada do passado.
Troco-a por Saudade: - que é recordação suave de pessoa ausente ou coisa distante, que se deseja ver ou possuir, alguém que nos é querido. Sentimentalmente.
Os dias hoje, tirando as malditas drogas, que geram toda a violência, é bom de se viver.
Esclarecendo algo pertinente. Não é que não sabia que eu tinha um problema no coração!? Não havia nenhum sintoma, nada! Certo que não fumo, e há muito, lá na juventude, deixei de qualquer tipo de bebida alcoólica. Nunca gostei mesmo! E faço caminhadas regularmente.
E, numa investigação médica, o doutor me acha com um problema na artéria descendente anterior do coração. Fui mandado para a Beneficiência Portuguesa em São Paulo, capital. Lá verificaram que eu tinha, só 5% de passagem de sangue, pela citada artéria. Havia 95% de oclusão por plaquetas gordurosas. Nunca fui de churrasquear, comer carne gorda e tudo o mais. Mas o fato é que, se não fosse o avanço da medicina, que por catéter chegaram à artéria e inflaram um balão desobestruindo-a, -visto que não suportaria um "Stent"- dado a fina espessura de minha artéria. Não fosse esse avanço médico e moderno, baubau, já era um recantista!
Por que estou citando isso? Para ser vítima? Não! Para dizer que hoje é melhor que ontem e pior que amanhã, graças à Deus.
Agora, saudade - SAUDADE -, são outros quinhentos. Esse sentimento é precioso. Não mora no passado, é atemporal não tem idade para sentí-lo. Nem etnia, cor, distância em que se mora, sexo, nacionalidade ou qualquer outra circunstância. É puro sentimento de recordação suave e desejável. Desejo este presente, de alguém ausente a qualquer tempo. São flores depositadas no altar do amor ausente.
A saudade tem cheiro, tem cor, tem consistência, embora seja abstrata é o mais real dos sentimentos.
Pensemos na primeira namorada.
Temos saudade de seu perfume, do gosto de seu batom e é um sentimento tão real, que nos faz lembrar após 40 anos, quando a brisa trás um leve perfume, o comparamos com o da menina que lá deixamos no passado, lembramos perfeitamente do gosto do batom que ela usava.
Uma música nos leva até ela. Tudo isso é saudade.
Sentimento que só o idioma português denomina. Nenhuma outra língua no mundo consegue por meio de uma só palavra envolver nossa mente e fazê-la produzir reflexos satisfatórios à memória, aos sentidos, ao coração, fazendo-o vibrar ao compaço do amor que se foi. Que não mais é. Mas continua sendo.
Tudo isso é Saudade. Que não se confunde com Saudosismo.
Usei o título de Saudade é feita de ausências:
- É uma forma de viver para sempre, porque "os olhos dos velhos vão se enchendo de ausências" até o fim do caminho, que pode ser muito longo. E a alma não as deixa.
Nossa alma - nossa mente -, sabe o que foi nosso de verdade, nada mais particular que o amor, o que ela me disse, só eu sei. O que eu disse a ela só ela soube. O timbre da voz que ela usava para mim, era só para mim. Foi para ela, só dela as palavras, os gestos, os atos, os afetos. De ninguém mais. Ainda que milhares de outras passassem pela minha vida, o que foi dela, nem a morte retira ou modifica. Personifica.
Isso é pela força da saudade que se torna uma realidade. Porque existiu. Aconteceu...a alma acolheu.
A mente - nossa alma - sabe o que é sonoro, lindo, perfumado, macio, sedoso. Conhece e não esquece o belo. Isto foi ela. Seu corpo, seus braços, sua boca, seus longos e lisos cabelos sedosos. Seu olhar. Seu perfume. A saudade nos faz lembrar do que foi nosso ou aconteceu há muito, muito tempo, como se fosse hoje.
Disse o poeta: -"Tenho mais saudade de sua foto do que você mesma, porque você irá, e a foto ficará para sempre..."
Tudo isso se chama SAUDADE!
Na verdade tenho medo de ser saudosista, me policio para não ser um deles.
Quando vejo um "antigão" começando a falar: - "No meu tempo...!" - Xii, lá vem saudosismo! Todo tempo é um Tempo. Com sua roupagem, com suas tramas, com seus falares. Ninguém fala mais: "supimpa", mas era palavra na "boca da moda". Ninguém põe o nome de Boanerges, Teófilo (Teophilo) Aureliano, Gertrudes, Castorina, Tereza Joaquina, Normandia, Ubaldino, etc.
Os tempos mudam (tempus fugit) as saias das mulheres arrastavam o pó das ruas descalças e poeirentas; ostentavam chapéus, toucas...! Os homens com aquele calor do Rio antigo, como dizem nossos bons amigos portugueses, todos de "fato" (terno), gravata borboleta e chapéu ou cartola. Colarinho engomado, e notem, ternos de casimira inglesa, grossa como manta de lã (visto que na Bretanha neva e faz frio) e pior, de colete por baixo. Pobres coitados daqueles que queriam andar na moda ou arrancar suspiros das moçoilas.
Pois é, saudosismo para quê! Saudades de ir buscar lenha no mato como nossas avós e conforme a nossa idade, até mesmo nossas mães, quando adolescentes ou crianças? Fogão de lenha, hoje é chique ter um na chácara, mas quero ver ter um dentro de casa, com aquele fumacê, enchendo o tellhado de picumã (fuligem grudada nas teias de aranha, preta que nem carvão) e ainda havia quem pusesse picumã nos ferimentos das pessoas e crianças, para estancar o sangue e cicatrizar. Na minha família, minha avó, Dona Chiquinha (Francisca Pinheiro de Camargo Martins), cabocla, tentava pôr picumã em nós. Meu pai, socorria, pegava logo o guri e usava a "pedra-ume" que sempre tinha numa gaveta, depois de limpar o machucado com álcool puro. A gente pulava e gritava, sapateava de dor e ele não largava até fazer o curativo: à "moda gaúcha" dele.
Outra coisa que não faltava era o fungo, que parecia uma esponja grande. Apertado, soltava um pó amarelo em cima do ferimento que estancava na hora o sangue. Era pura penicilina em natura!
Então, queremos tudo isso de volta? De minha parte digo, "é claro que não!". Temos hoje tudo à mão. Luz, (antes lamparina e velas, lampião era luxo de quem podia) o nariz da criançada e de todos, amanheciam pretos nas narinas. Era de respirar a fuligem do pavio queimado.
Hoje a energia elétrica é o cérebro e o coração do mundo. De um motorzinho de aquário à medicina avançada.
A água, era de poço, tinha que ser tirada na manivela do "cambote" que enrolava a corda e puchava o balde, ou então era no "muque" puxando a corda que passava em uma carretilha de ferro. Hoje, jorra nas torneiras internas e nos luxos mais supérfluos.
Enquanto o banho era de caneca com a pessoa em pé numa bacia grande ( que chamavam baciona) a mãe esfregava sabão (de lavar roupa, feito em casa) com bucha. Arranhava que era uma desgraça. Por isso é que as crianças queriam fugir do banho. Era um sacrifício de pagar os pecados!
Voltando ao início, é por isso que não dá para ouvir saudosistas contarem seus "causos".
Existem os "causos" dignos de serem escritos, lidos e recontados é claro. Bem interessantes, brilham como vagalumes (que já estão quase extintos, ou extintos não sei, pois não os vejo mais). Mas sendo como: "causos"; que quase acabei contando sem querer. E não desta forma: - "no meu tempo é que as coisas eram boas etc e tal".
Tive um colega na Academia Guaçuana de Letras, grande cronista com dois livros editados e outros por editar com centenas de crônicas nos jornais; que atingiu seus 87 anos de vida.
Pouco antes de falecer, nos corredores da Faculdade "Imaculada", que nos levam ao local de nossas reuniões, ele citou-me em meio a uma conversa literária, que: - "É terrivel o velho saudosista"; continuou ele (com sua voz suave) : - "com esse sujeito então, (dizia) é melhor desconversar ou trocar de parceiro de prosa". Imaginem, 87 anos com essa visão!
Pensei: - Não quero isso para mim. Saudosismo não!
Saudosismo segundo o Aurélio é a valorização demasiada do passado.
Troco-a por Saudade: - que é recordação suave de pessoa ausente ou coisa distante, que se deseja ver ou possuir, alguém que nos é querido. Sentimentalmente.
Os dias hoje, tirando as malditas drogas, que geram toda a violência, é bom de se viver.
Esclarecendo algo pertinente. Não é que não sabia que eu tinha um problema no coração!? Não havia nenhum sintoma, nada! Certo que não fumo, e há muito, lá na juventude, deixei de qualquer tipo de bebida alcoólica. Nunca gostei mesmo! E faço caminhadas regularmente.
E, numa investigação médica, o doutor me acha com um problema na artéria descendente anterior do coração. Fui mandado para a Beneficiência Portuguesa em São Paulo, capital. Lá verificaram que eu tinha, só 5% de passagem de sangue, pela citada artéria. Havia 95% de oclusão por plaquetas gordurosas. Nunca fui de churrasquear, comer carne gorda e tudo o mais. Mas o fato é que, se não fosse o avanço da medicina, que por catéter chegaram à artéria e inflaram um balão desobestruindo-a, -visto que não suportaria um "Stent"- dado a fina espessura de minha artéria. Não fosse esse avanço médico e moderno, baubau, já era um recantista!
Por que estou citando isso? Para ser vítima? Não! Para dizer que hoje é melhor que ontem e pior que amanhã, graças à Deus.
Agora, saudade - SAUDADE -, são outros quinhentos. Esse sentimento é precioso. Não mora no passado, é atemporal não tem idade para sentí-lo. Nem etnia, cor, distância em que se mora, sexo, nacionalidade ou qualquer outra circunstância. É puro sentimento de recordação suave e desejável. Desejo este presente, de alguém ausente a qualquer tempo. São flores depositadas no altar do amor ausente.
A saudade tem cheiro, tem cor, tem consistência, embora seja abstrata é o mais real dos sentimentos.
Pensemos na primeira namorada.
Temos saudade de seu perfume, do gosto de seu batom e é um sentimento tão real, que nos faz lembrar após 40 anos, quando a brisa trás um leve perfume, o comparamos com o da menina que lá deixamos no passado, lembramos perfeitamente do gosto do batom que ela usava.
Uma música nos leva até ela. Tudo isso é saudade.
Sentimento que só o idioma português denomina. Nenhuma outra língua no mundo consegue por meio de uma só palavra envolver nossa mente e fazê-la produzir reflexos satisfatórios à memória, aos sentidos, ao coração, fazendo-o vibrar ao compaço do amor que se foi. Que não mais é. Mas continua sendo.
Tudo isso é Saudade. Que não se confunde com Saudosismo.
Usei o título de Saudade é feita de ausências:
- É uma forma de viver para sempre, porque "os olhos dos velhos vão se enchendo de ausências" até o fim do caminho, que pode ser muito longo. E a alma não as deixa.
Nossa alma - nossa mente -, sabe o que foi nosso de verdade, nada mais particular que o amor, o que ela me disse, só eu sei. O que eu disse a ela só ela soube. O timbre da voz que ela usava para mim, era só para mim. Foi para ela, só dela as palavras, os gestos, os atos, os afetos. De ninguém mais. Ainda que milhares de outras passassem pela minha vida, o que foi dela, nem a morte retira ou modifica. Personifica.
Isso é pela força da saudade que se torna uma realidade. Porque existiu. Aconteceu...a alma acolheu.
A mente - nossa alma - sabe o que é sonoro, lindo, perfumado, macio, sedoso. Conhece e não esquece o belo. Isto foi ela. Seu corpo, seus braços, sua boca, seus longos e lisos cabelos sedosos. Seu olhar. Seu perfume. A saudade nos faz lembrar do que foi nosso ou aconteceu há muito, muito tempo, como se fosse hoje.
Disse o poeta: -"Tenho mais saudade de sua foto do que você mesma, porque você irá, e a foto ficará para sempre..."
Tudo isso se chama SAUDADE!