Cheiro de Morte
Em uma noite fria, silenciosa, inquietante. Tento procurar o que mais me persegue. É como uma dor sufocante
como se eu não pudesse respirar, é tão forte que tem cheiro de morte.
Sabe aquele cheiro que você sente quando entra em um cemitério e tem flores rodeando por todos os lados,
como se fosse um conforto, mas na verdade é apenas um aviso de que o fim chegou.
É esse o cheiro que sinto nesse momento, esse cheiro que faz com que meu peito se aperte, minhas mãos fiquem geladas,
e eu deseje como nunca na vida que isso acabe, que isso tenha um fim.
Fecho meus olhos na esperança de abri-los já com o sol batendo no meu rosto, com as pessoas andando pela casa, com a vida
seguindo seu rumo, como se essa dor ficasse na cama junto com meu cobertor dobrado.
Pobre ilusão, pois ao abrir meus olhos vejo que nada mudou. O escuro continua, as respirações ao meu redor me mostrando
a paz que o sono está dando aos que tem a sorte de fechar os olhos na hora que os pensamentos mortíferos aparecem.
Sim é isso que me persegue. É isso que não meu deixa dormir. Meus pensamentos! Como tira-los de dentro de mim? Como fingir que
não estão aqui? Eles fazem parte de mim, eles são sobre mim. Não se pode simplismente tira-los. Não sem consequências.
Já se passaram 3 horas, e ainda tenho algumas pela frente. Preciso me recompor, pois quando o sol finalmente bater em meu rosto preciso
de brilho em meus olhos, preciso fingir que nada acontece, afinal precisamos levar a vida, fazer parte desse castelo de areia, que pode cair a qualquer
momento. Preciso fingir que não sei disso. Afinal, não é o que todos fazem? A esse hora não estou certa da resposta. Vendo todos dormirem, aproveitando seus sonhos, seus planos
inconscientes.
Será que eu sou o problema? Será que meus pensamentos são tão diferentes dos outros? Será que sou a única a sentir o cheiro das flores?
Penso que sim. Mais uma hora se passou. Isso é um tormento. Passando pela casa, o silêncio é perturbador. Nem o barulho do vento posso ouvir mais.
Me deito novamente na esperança que o sono venha. Fecho forte meus olhos. Tento me concentrar na procura do meu sono agora. Assim posso me distrair um pouco para não sentir mais o cheiro.
Por um momento dá certo. Pelo menos até me conformar que não tão cedo irei dormir.
Começo a pensar nas notícias do dia, isso pode ajudar a mudar a linha dos meus pensamentos. Ah que ótimo, típico. Penso no pobre garoto acusado de matar toda a família, ir tranquilamente
para escola, assistir a aula, e voltar para a sua família já composta apenas de cadáveres. Todos deitados, tranquilamente, com seus corpos cobertos de sangue. O que passou em sua cabeça naquele
momento? Dor na consciência? Medo das consequências? Ou apenas achou que iria encontra-los em algum lugar? Nunca saberemos, não sabemos nem se foi ele o culpado por tudo isso.
Se assim for, só consigo pensar no que se passou na sua cabeça naquelas horas. Será que ele sentiu o cheiro das flores? Ahh que horror, não não! Ele não teve tempo para esses pensamentos,
acredito que esses pensamentos me fazem refletir no futuro, e não no fim.
O que vejo! Sim é o sol. Ele está chegando, levando os meus pensamentos, os guardando para quando ele se pôr novamente. Me esqueço do pobre menino e sua família cadáver.
Agora só penso em me jogar na cama e fazer a cara de paz, de noite bem dormida. Me preparar para o novo dia, para o futuro, recarregar minhas forças no sol que acaba de chegar para mais tarde ter mais uma
noite de repleta escuridão. Para mais pensamentos sufocantes. Para mais cheiro de morte, que no fim das contas, acaba trazendo a vida renovada, com o barulho das risadas daqueles abençoados com suas noites de sono. Me preparando para mais cheiro de morte.