LEMBRANÇA DE CONFORTO

NO INÍCIO DA MADRUGADA DE 31 DE JULHO DE 2013

Nestes tempos de dor e de ermo absolutos, de repente me vem uma lembrança de conforto, de estranho conforto, de conforto paradoxal: Há nove anos, tu me telefonando, alguns dias após a cirurgia em que me haviam retirado do corpo aquele tumor o qual, conquanto benigno, imenso e pesado como uma criança morta prematura. E quando eu te disse o peso da coisa que haviam retirado de meu corpo, tu perdeste a respiração porque sentiste a dor minha no teu corpo. Custaste a voltar a respirar. Talvez não tenha restado nada de mim neste teu homem de hoje, esquecido das coisas que foram nossas; não creio que ele, este teu homem de hoje, possa sentir na sua própria alma algo da agonia da minha alma neste agora, como sentiu, há nove anos, a dor do meu corpo em seu próprio corpo. Seja como for, neste presente momento de solidão indescritível, de todas as solidões possíveis... e impossíveis, a lembrança daquele momento, há nove anos, me está servindo de consolo, de fundo consolo paradoxal. Aquele teu homem, ao menos naquela ocasião, de verdade me amou.

****************************************************