Chuva...
Não tenho medo da chuva, de forma alguma. Muitas vezes paro no meio dela e fico olhando pra cima. Penso na minha irmã, que foi quem me ensinou o valor das pequenas coisas. Mostrou-me como aproveitar um pouco a vida. Ao ver asas no céu em dias que o sol torna o céu vermelho. Ela desejava voar e ser como os anjos. Ao observar as folhas caindo sobre a grama refletia sobre a morte. Fez-me reparar naquela camada fina de água que fica sobre a grama depois de um nevoeiro, dissera que era um véu que a chuva colocava sobre a grama. Era de tempos em tempos a sua única forma de união. Quando chove, ás vezes eu paro e coloco a língua para fora tentando beber o máximo possível de água, é estranho, mas é legal. E sempre me vem o rosto dela ao pensamento. Ela dilacerou parte do demônio que me habitava, não a culpo mais por isso, era sua natureza, natureza de um anjo. Hoje em dia penso na chuva como seu choro, pois já não está mais entre nós e ela lamenta muito, sofre e de alguma forma me faz sofrer todas as vezes que chora. Suas lágrimas tocam o meu rosto assim que olho para cima, dou um sorriso todas às vezes antes de chorar ao seu lado.
A minha dadiva a tirou de mim, pois o tempo não passava para ambos. Vi seus cabelos mudarem de cor, seus sorrisos ficarem cada vez mais pálidos, tristes e murchos. Contei cada ruga que habitou aquele lindo semblante. O tempo foi mais cruel com ela do que a própria morte. E ele mudou tudo, inclusive a minha forma de pensar. Hoje eu não vejo mais a minha imortalidade como dadiva, mas como a pior das maldições que só pode ser sentida por aqueles que a contemplam.