SABER


 
Que saber é suficiente saber? Não sei. Sequer sei se algo realmente sei. Talvez saiba que quase nada sei. Mas sei o suficiente para saber que tudo que sei esteve no passado, e é por definição incompleto, posto que meu cérebro é limitado, imperfeito, viciado, incontrolável e arrogante como só, para tudo processar, e como agravante maior meus sensores que fazem a interface entre a mente que emerge do cérebro e o real externo a ele, com a realidade que pouco sei, são também frágeis, imperfeitos e incapazes de perceber toda a realidade da existência física deste mundo imanente que habito e do qual sou parte não somente como usuário, mas por constituição e emergência.
 
Existe um saber mínimo? Existe um saber máximo? Existem sim saberes, mas que são de dificílima certeza absoluta, por isto uma mente livre é aberta a mudanças do que sabe, desde que corroborada por provas, análises críticas e lógica imanente. Não existem autoridades do saber, não existem revelações gratuitas, não existem saberes que podem abrir mão da verdade, que possam abrir mão de uma análise neuronal séria, não existem saberes intuitivos puros (aliás a intuição é por si só uma fonte miserável de equívocos. Quem falou que o saber ou a verdade tenham que ser intuitivo, belo, ético ou justo?), ou não existem saberes que se adequem a verdades pessoais. A verdade é o saber supremo, sempre buscado, mas talvez nunca alcançado em sua absoluta imanência. Por isto, junto com minha veia científica sou bastante cético por definição e princípio. Tudo que sei pode estar errado, mas tudo que sei pode também estar correto, é provável que parte do que sei seja verdade e parte do que creia saber seja vício, preconceito, pura crença, puro desejo que confundo com saber, pura vontade que confundo com verdade, pura fraqueza e medo de encarar a verdadeira verdade.
 
A verdade não é eterna em sua realização, a verdade reflete um ponto específico no espaço-tempo que nos possibilita existir, assim ela é sempre passado, não a posso repetir, mas posso discorrer sobre ela, e ai posso introduzir erros, preconceitos e interesses. Posso realizar experimentos para buscar alguma comprovação de que aquela verdade passada possa ser verdade, mas o que experimento e realizo de novo é nova verdade que descubro. Preciso ter muito cuidado com a indução. A indução nunca foi caminho de verdade, a indução nunca foi prova de verdade, apenas a dedução e a comprovação podem ser fontes de verdades.
 
Que saber é suficiente saber? Não sei. Mas creio que o saber é um dos bens maiores que devemos seriamente buscar. Agora saber sem prática humana de nada serve. Saber sem amor é até mesmo perigoso, pois pode nos levar a arrogância do saber como segregação e forma de subjugar irmãos. Mas tenho também alguma certeza que o próprio amor sem saberes e sem verdades “verdadeiras” é um caminho para a destruição humana por preconceitos, crenças, superstições e fraquezas. O saber necessita do amor, como o amor necessita de saberes.
Que saber é suficiente saber? Talvez poucos como: Devo buscar sempre o saber na verdade, devo sempre buscar o amor na verdade, devo amar a vida e assim amarei todos os irmãos em essência de vida e verdade, devo estar preparado para saber que desejos, vontades e crenças são perigosos e posso estar no caminho errado por isto, devo saber que saber requer esforço, seriedade, ceticismo e pesquisa, e devo saber que nunca saberei tudo, e devo saber que devo sempre estar preparado para jogar fora o que sei se evidências sérias assim corroborem com novos e antagônicos saberes, e finalmente devo saber que que o homem é intrinsecamente 
mau, sinistro, perverso, interesseiro, vaidoso e prepotente, e por isto, sendo eu humano, tenho que tomar o máximo de cuidado para não estar, eu mesmo, contaminado até a essência com as fraquezas humanas. 
Arlindo Tavares
Enviado por Arlindo Tavares em 11/05/2013
Reeditado em 11/05/2013
Código do texto: T4285915
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