Um pensamento sobre o divino...
O indivíduo social é capaz de interagir com outros indivíduos, sejam da mesma sociedade ou não, e fazem trocas de informações. Assim, ocorre uma evolução social a que chamo humana, mas aqui cabe inserir uma dúvida: E o divino, como evolui? Não é socialmente, definitivamente. Entretanto, ocorre que o amor, a fé e a esperança são fatores essenciais para o desenvolvimento divino, mas, na nossa sociedade, eles são socializados, o que impede o desenvolvimento divino, que é individual. Assim, não há espaço para o inconsciente nas coletividades humanas, mas é no recinto individual que ele revela-se. Essa revelação pode ocorrer desde ações irracionais até confusões mentais em que ocorre o confronto entre o racional socializado e o irracional individual, o que leva, muitas vezes, a uma batalha interior. Aqui posso inserir uma necessidade que surge dessa realidade conflitante: A dualidade do conhecimento. Ou seja, há um conhecimento prático e teórico a que atribuímos um valor humano, mas, por outro lado, há uma sabedoria inconsciente que o homem persegue, desde o seu aparecimento, a que se deve atribuir, pretensiosamente, o valor divino.
Essa sabedoria consiste num pensamento que evolui de acordo com os valores culturais humanos do indivíduo e necessita de uma mente fecundada pelo prazer do desenvolvimento intelectual, moral e espiritual. Entretanto, não há ainda religião que se configure como instituição com crenças no divino, ritos divinos, objetos divinos e igreja divina do ponto de vista do outro lado do conhecimento dual, pois toda a produção humana sobre o assunto foi racional. Assim, o irracional é um saber que o homem não domina, mas pode perceber por revelações de entidades divinas que às vezes aparece no nosso planeta, mas cuja compreensão não transgrediu a barreira cultural criada pela necessidade social humana. Dessa forma, o homem fica impossibilitado de racionalizar o divino e atribui a sua compreensão àquilo que se convencionou chamar de Deus.
A compreensão humana envolve fatores sentimentais que turvam a sua leitura de mundo e impedem-no de identificar o óbvio: Não há outro Deus senão o próprio homem, ou seja, o homem é o criador do próprio divino, mas na condição primordial de natureza, que é uma transformação da própria existência daquilo que o homem produz e disso nasce o divino, que é traduzido pela fantasia. Aqui cabe explicar a condição primordial de natureza enquanto transformação da existência da fantasia humana: O homem precede a existência de si mesmo através da própria fantasia, mas é necessário entender que tal fantasia, enquanto existência irracional do inconsciente, é transfigurada para a expressão do divino e, por isso, precede o homem. Porém, há um fator importantíssimo para explicar essa precedência da fantasia ao homem: O divino toma status de fantasia quando contrastado com nosso Universo material e espiritual. Por isso, a fantasia é uma realidade expressa como fotografia de um filme. Entretanto, a fantasia não é imortal como o divino, mas perecível diante do homem que a destrói enquanto essência independente quando a escreve e eterniza a si e dá voz à fantasia. Assim, a fantasia é usada pelo eterno quando ela já foi abstraída e intuída pelo homem, ou seja, já não mais existe em sua totalidade no perfeito, do que se conclui que é o homem que cria o corpo de Deus.
A forma de o homem expressar-se é construída com base na visão que ele tem do mundo, por isso ele não tem como expressar determinados pensamentos a que o homem chama de irracionais. Assim, a realidade, para o homem, restringe-se ao que a razão alcança, mas se esquece de que o divino não está racionalizado e não pode ser compreendido sem antes o homem admitir a sua existência. Tendo essa existência como axioma, podemos criar as bases da lógica irracional.
O divino é irracional, logo não pode ser compreendido racionalmente, então façamos um jogo com ele para expressá-lo de forma a não perdermos o foco lógico-racional: O indivíduo deve dedicar um minuto à observação das imagens que lhe surgem quando de olhos fechados, em seguida pense em como traduzi-las linguisticamente. Aí começa o jogo e as regras são: não duvidar da sua visão e expressá-la sem medo, mas, se falhar, o jogo reinicia até a pessoa expressar seus pensamentos. Concluo que há uma regra do irracional a ser quebrada, que é a sua não expressão, porém se deve entender que não se pode expressá-lo diretamente sem o concurso deste jogo. Sabendo que o irracional pode ser observado, pode-se deduzir que ele possui valor positivo e pode ser considerado como estando além da criação racional humana, sendo fruto do inconsciente. Aqui chegamos à conclusão de que o divino é observável, mas não abstraível, logo pode ser visto, mas não falado; portanto é lógico que o irracional tenha como regra a lógica dos sonhos, que se constitui de uma forma de raciocínio mais complexo, pois é divino; por isso não pode ser dito, mas demonstrado.
A demonstração do raciocínio divino pode ser feita por um sonho: Sou um ator de cinema e jogo futebol americano, de repente torno-me um assassino em série e acordo fugindo de um boneco assassino. Aqui não cabem explicações psicológicas racionais, mas vejamos como interpretar o sonho. Em primeiro lugar, o sonho é a expressão do irracional e este não se processa pelo racional, por isso deve ser interpretado com a lógica irracional. Então, fechemos os olhos e tentemos mentalizar o sonho. Esse sonho se processou inconscientemente e produziu em nossa mente uma sensação de descanso, por isso o irracional é um relaxamento do nosso organismo, mas há como o usar para uma outra finalidade: Compreender a si mesmo. O ator era o indivíduo em seu meio social e o jogo de futebol americano era a luta entre ele e os concorrentes do cotidiano, o assassino em série era o animal que ele escondia dentro de si e o boneco assassino era o distanciamento entre o indivíduo social e o animal, ocorrendo ao mesmo tempo uma união entre o animal e a criança do passado, o que exige um amadurecimento. Ou seja, o sonho trata do amadurecimento do indivíduo. Então, pode-se compreender que há uma interpretação irracional à qual eu não chego porque não pode ser dita, mas vou margeando a sua significação e é assim que se lida com o divino.