Você pode estar certo

Você pode estar certo. Você pode estar errado. Somos soldados armados até os dentes com nossas certezas incertas.

Eu posso estar certo. Eu posso estar errado. Somos seres incertos de uma certeza absurda apenas pela arrogância de sermos melhores e pela prepotência de termos a certeza que estamos no controle revestidos que estamos pela soberba de encontrarmo-nos apenas de passagem para um mundo melhor.  Justificamos a dor alheia como atalhos para a felicidade posterior. O sofrimento de agora é a certeza de um porvir de luz e eterna felicidade.

Nós podemos estar certos. Nós podemos estar errados. Os preconceitos enraizados nos fazem absurdos ambulantes.
Nas contradições somos aberrações humanas que mais parecem frutos de uma absurda incoerência, daqueles que possuem a certeza de serem coerentes com algum desígnio natural ou transcendente. Isto tudo porque nos falta humildade e respeito sincero na busca das verdades, não minhas, não suas, não necessariamente nossas. Não importa, ou importa quase nada nossa percepção desta ou de qualquer verdade, importa sim buscar as engrenagens verdadeiras que povoam o submundo real dos fenômenos.
Sempre percebemos no passado e de forma introspectiva, mas podemos não dar máximo valor ao percebido, e sim ao modelado, ao experimentado e aos sinais que evaporam constantemente de tudo aquilo que realmente existe, independente do como o percebamos.
 
No geral somos bestas que se sentem deuses, somos demônios em pele de santos, somos monstros em corpos de animais, por mais que neguemos, ou não estaríamos aqui, eu e você escrevendo ou lendo, e estaríamos sim em plena realização de uma revolta humana e social pela desconstrução de tudo aquilo que aqui está, e que foi erguido em nome de um falso amor, de falsos princípios de dignidade humana, costurados por interesses sub-humanos, reforçados por miséria social e transpassados por preceitos místicos ou seculares que desonram todo e qualquer animal social. Uma sociedade construída sobre princípios de amor transcendental se perdeu pelo caminho, creio que mesmo que fosse erguida sobre amor natural e imanente sucumbiria também, pois somos uma miserável espécie que se crê imagem e semelhança de um deus, mas muito mais somos mesmo o demônio sob forma de belas palavras, sob imagem de templos de amor, sob desígnios misteriosos daqueles que se acham autoridades no saber e verdadeiros interpretes da vontade misteriosamente escondida em véus de ganancia e poder.
 
O amor verdadeiro é tão maravilhoso que entendo hoje ser impossível de alcançá-lo em sua totalidade, creio que teria muito mais nos bastado apenas trabalhar, pelo menos enquanto não estivermos preparados para amar em totalidade e em verdade, em uma sociedade baseada em respeito humano e coletivo. Entendo ser o respeito muito mais palpável a curto prazo, mas na busca incerta de um amor perfeito e utópico nos perdemos em uma sociedade desumana e excludente.
 
Sou tão culpado como todos, aceitamos esta realidade, e perdemos a dor do sofrimento pela dor do sofrimento alheio. Somos culpados por aceitar, por sermos coniventes ou por mera omissão, mas somos mais culpados por nos escondermos por traz de boas ações para nos eximir de culpa pelo que aqui está. O sistema que criamos é tão perverso que nos faz inúteis na percepção de nossa força de revolta. O sistema é tão maléfico que faz das pessoas boas, meros perpetuadores do que aqui está, sua caridade, suas obras de assistência social, seus comportamentos de paz fazem com que nada mude. A entropia tende sempre a crescer, a desordem tende sempre a aumentar, somente podemos interromper o poder da entropia da maldade humana com aplicação de energia e esforço, mas a falsa paz que convém ao sistema perpetua a inércia e assim a entropia reina livre e poderosa. Tenderemos sempre ao descontrole e a desordem, e nós sabemos quem mais sofre com esta entropia crescente, o pobre, o miserável, o excluído e o abandonado.
 
Você pode estar certo e eu errado, o caminho que escolhemos seguir pode nos levar a dignidade coletiva. Eu pessoalmente não consigo ver isto, mas talvez seja meu preconceito falando alto...

Arlindo Tavares
Enviado por Arlindo Tavares em 14/04/2013
Reeditado em 14/04/2013
Código do texto: T4241101
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