Fracassados!

Vivemos num tempo de fracassados. E isso porque em nossa liquida sociedade aumentou-se os padrões de exigência. Hoje somos o que temos. Se não temos ficamos desesperados para ter, porque se não tivermos as últimas tendências do momento não somos ninguém, ou melhor, somos sim: fracassados! E ninguém quer ser fracassado.

Nessa sociedade de consumo é inadmissível não ter o que compartilhar em minha vitrine do facebook; onde seleciono os melhores produtos de mim para que os outros possam consumir, curtir, compartilhar e me fazer alguém. Somos uma geração idolatra. Como assim idolatra? Não me ajoelho diante de nenhum ídolo e até vou à igreja “evangélica” que não contém imagens. Pensamos a idolatria sempre no âmbito religioso de imagens e orações em algum templo, mas a verdade é que com medo de não sermos contados entre os fracassados, criamos para nós mesmos bezerros de ouro, iguais ao criado pelos israelitas no deserto. Esses são os deuses da beleza, do poder, dinheiro, sexo e do sucesso.

Como bem disso o pastor Timothy Keller, em seu livro “Deuses falsos”:

Podemos não ajoelhar fisicamente diante da estátua de Afrodite, mas muitas jovens de hoje são levadas a depressão e disfunções alimentares por uma preocupação obsessiva com a imagem. Podemos não queimar incenso a Ártemis, mas, quando o dinheiro e a carreira são elevadas a proporções cósmicas, realizamos algo como um verdadeiro sacrifício de crianças, negligenciando a família e a comunidade para conquistar um lugar mais elevado no mundo empresarial e angariar mais riquezas e prestígio (2010, p.11).

Muitos corações estão tão empenhados em não serem, ou pelo menos não se sentirem, fracassados, que acabam por serem dominados por determinados ídolos. E o que é um ídolo? É qualquer coisa que seja mais importante que Deus; qualquer coisa que absorva seu coração e imaginação mais que Deus. Um falso deus é qualquer coisa que seja tão central e essencial na vida que, caso você a perca, achará difícil continuar vivendo. Um ídolo é qualquer coisa que te faça perder o senso de controle e moral, fazendo tudo para conquista-lo. Um ídolo é qualquer coisa que te diga que o possuindo, não importa como, você não mais será um fracassado.

No ano passado comecei meu processo de tirar carta, e também de “fracasso”, e por um descontrole de ansiedade junto com a corrupção eu não consegui tirá-la. Muitos foram os conselhos para pagar o tão famoso “quebra”, no entanto, me recusei e me recuso a vender minha consciência e a alimentar o que acaba com nosso país, a corrupção. Teve gente que me chamou de fracassado, afinal, muitos de meus amigos já dirigem e tem carro, e eu aqui sem carta e carro. Tenho que ser sincero em dizer que me senti um fracassado, até porque os olhares de muitos não me permitiam me sentir de outra maneira. Familiares indagando e perguntando onde estava minha carta e apontando Fulano e Ciclano que conseguiram a habilitação.

Outra experiência de fracasso que passei foi quando no desejo de casar e conseguir um teto para morar me deparei com o monstro da bolha imobiliária. Vi os preços cada vez mais altos e meus recursos cada vez mais baixos. E novamente me vi lá diante da plateia puxa para baixo apontando o “sucesso” desse e daquele; e sempre me dizendo que se eu tivesse escolhido um caminho diferente estaria bem melhor do que estou hoje. Pois é, tem sido dias difíceis e pra ajudar não tenho facebook pra selecionar uma série de fotos felizes para ser curtido, compartilhado, consumido e me sentir menos fracassado. Não tenho também os últimos celulares, tablets, roupas, tênis e tudo que levanta o moral em nossos dias. Pois é, sou um “fracassado”.

Mas descubro que não estou sozinho. Tenho encontrado muitos “fracassados” por ai. “Fracassados” por condição e outros por opção. E esses “fracassados” tem me ajudado a continuar caminhando sem a tirania moderna do ter para ser. “Fracassados” históricos como homens e mulheres que viveram sua vida sem nada ter. Encontro minha identidade naquela que poderia ser classificado como o maior “fracassado”, Jesus Cristo, que “mesmo em condição de igualdade com Deus, nunca pensou em tirar proveito disso, de modo algum. Quando sua hora chegou, ele deixou de lado os privilégios da divindade e assumiu a condição de escravo, tornando-se humilde! E depois disso permaneceu humano. Foi sua hora de humilhação. Ele não exigiu privilégios especiais, mais viveu uma vida abnegada e obediente, tendo também uma morte abnegada e obediente – e da pior forma: a crucificação” (Filipenses 2.5-8 – A Mensagem). E foi esse mesmo Jesus quem superou a tentação do deserto com o Diabo, o qual lhe disse que era um fracassado porque estava com fome (Mateus 4.1-3); naquela ocasião ele, Jesus, não tentou se mostrar um não fracassado transformando pedras em pães, antes, sorriu para o tentador e disse: “É preciso mais que pão [carta, carro, casa, dinheiro, sexo, celulares, tablets...] para permanecer vivo. São necessárias palavras firmes que procedem da boca de Deus” (Mateus 4.4 – A Mensagem).

Se ser “fracassado” é não ter nada mais a não ser Deus, eu sou um fracassado. Eu não tenho nada que é considerado definidor de sucesso. Mas eu tenho Deus e apenas Deus. Tudo o que tenho o tenho por causa de Deus e sei que tudo o que eu possa ter só terei por causa de Deus, porque eu só tenho Deus. Em uma “conversa” com o grande C.S. Lewis ele me disse que quem tem todas as coisas “não tem mais que aquele que tem apenas Deus”. E quem sempre se mantiver tendo apenas Deus, como um fim em si mesmo, nunca será um fracassado.

Ismael Braz
Enviado por Ismael Braz em 04/04/2013
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