MAT
Acordar tiritando de ódio só por ter acordado não é lá muito saudável. E me habituei a isso. Não estou muito saudável. Sequer sinto que dormi. Sinto só essa vontade de vomitar. E denomino "vontade de vomitar" tudo aquilo que não consigo denominar, tudo aquilo que paira no incognoscível e caga feito pombo na minha cabeça e me bota pra baixo me bota no desejo de forca no desejo de faca no desejo de extinção de calar a boca de tudo e de todos no segundo que precede a primeira entonação de voz que vem em minha direção para me macular me sujar me deixar com o fedor das subjetividades alheias. Acordo com um ódio de início indirigível que conforme os minutos passam se volta contra mim. Tremer, tremer de angústia. Sentir gastura por ser um grão de poeira inútil na vastidão do tempo e do espaço e sentir gastura por ser inepto até para exercer essa função inglória de apenas respirar feito um verme qualquer, o verme insignificante que sou e que somos. Meus olhos crispam em aversão quando me encaro no espelho. A ojeriza abunda nas minhas pupilas: eu não me suporto. Eu não me aguento, não já me aguento mais. Não aguento mais tudo aquilo que me circunda, tudo aquilo que já tenha passado pelas minhas mãos pelos meus olhos pelos meus lábios pelo meu sexo. Quero morrer quando vejo esses sorrisos - que hão de sofrer os abandalhamentos da vida sem dó - voltados pra mim - não os mereço! Sou um fingido. Todos fingimos. Todos fingem. Fingidos. Fingidos. Repito, repito alto: fingidos! Não há um só sítio que frequento que não me sinto desprezível e que não desprezo na reciprocidade. Mesmo que seja ilusão abjeta, meu desprezo é bem direcionado e concreto. Esses olhos, esses olhos, esses olhos: quando foi que adoeci? Nem as lágrimas querem saber mais de me afagar o rosto; secaram, escafederam-se as cretinas... E chorar poderia amainar esse anseio pelo gosto da pólvora na minha boca, pelo atrito da corda em meu pescoço, pelo projetivo regurgitar instintivo das ingestões que pretendo fazer. Poderia ser um bálsamo repentino; algo que fizesse com que eu repensasse o que ando pensando quando não estou pensando em pensar em algo. Coragem, coragem, coragem: onde está você? Tudo o que me impele a continuar é pífio diante daquilo que me impele a partir e, contudo, onde está a coragem? Por que haveria Deus de querer a manutenção da existência de um vira-lata covarde? Por que não proveu, ao invés de um sem-fim de autocomiseração, um quinhão que fosse de coragem para que eu pudesse pular diante de um trem sem pestanejar? Não aguento mais, Deus, ter a imundície a escuridão fria do meu quarto como espelhos do que sou por dentro...
Eu juro que não aguento mais.
01/04/2013 - 18h00m