O meu sentido da vida
A angústia de uma colega de escola, no curso de mestrado em filosofia que estou cursando, a respeito do que é a vida, ou do seu sentido, levou-me a tentar escrever sobre tal assunto.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, do alto da sua experiência de 80 anos, em algumas reflexões que fez a respeito e que recebi pela Internet, diz que não há um sentido da vida que possa ser definido em um conceito objetivo. Diz ele que cada um de nós faz o seu próprio sentido da vida e, portanto, cada um de nós deve procurar pelo seu sentido da vida.
Muito bem, então eu vou dar o meu sentido da vida, neste momento.
Por que nos perguntamos sobre o sentido da vida? Parece-me que esta questão está intrinsecamente ligada à questão do sentido da morte. Porque a morte é a constatação da finitude da vida, de que a vida é provisória e fugaz. Logo, para entendermos o que é a vida, precisamos entender por que existe a morte. Perguntamos sobre o sentido da vida porque ela é boa e prazerosa e angustiamo-nos com a possibilidade da sua extinção um dia pela morte. Perguntem a um doente com alguma doença degenerativa atroz que defina o sentido da vida. Para ele a vida já não tem nenhum sentido ou objetivo, a morte é a sua salvação.
Assim, perguntar sobre o sentido da vida só tem sentido para quem acha a vida coisa muito boa para se extinguir. Se a vida é prazerosa, não queremos que ela termine. Logo, a verdadeira questão por trás da pergunta sobre o sentido da vida é: por que a vida tem que terminar se é tão boa de ser vivida?
Suponhamos, então, por hipótese, que eu consiga algum elixir milagroso que me torne imortal e nunca mais envelheça, permanecendo com a mesma aparência fixa para sempre. Eu veria meus parentes e amigos irem embora e viveria junto com as gerações seguintes. Num primeiro momento eu talvez até gostasse da situação. Mas com o passar do tempo e das gerações, eu passaria a ser uma aberração de circo de quem todos se afastariam. A vida já não teria graça nenhuma e eu passaria a amaldiçoar o dia em que tomei aquele elixir.
Por outro lado, vamos supor que todos poderiam tomar o elixir e todos viveriam para sempre. Mas aí não haveria a necessidade da reprodução sexual e da alimentação para subsistência da espécie. Para que essas necessidades sejam satisfeitas a natureza dotou-nos dos prazeres do sexo e da gula. Portanto, dois dos prazeres fundamentais da vida existem justamente porque a vida quer continuar através da sucessão de seus portadores individuais e mortais. Em suma, se fossemos todos imortais, a natureza não nos dotaria gratuitamente desses dois prazeres fundamentais que tornam a vida boa. Sem esses dois prazeres, teríamos tanta vontade de viver?
Assim, o sentido da vida está em manifestar-se nessa sua condição temporária, transformadora e sucessiva através de seus agentes individuais finitos. Dota seus portadores de prazer, não gratuitamente, mas por causa da sua finitude.
Logo, o objetivo da vida, ou, podemos dizer, o seu sentido, é o viver prazerosa e plenamente, dentro das possibilidades que dá a cada um, e aceitar que a morte é condição necessária para essa dádiva de podermos viver prazerosa e plenamente por um curto espaço de tempo. A morte dá sentido à vida, ao contrário do que o senso comum imagina.