Julho de 1997
É tudo antigo. E eu já não consigo me colocar no lugar de outra pessoa. Tenho milhões de anos de idade. Ali, sobre o plástico que encobre a mesinha empoeirada que uso como suporte para o cinzeiro, está a data gravada: julho de 1997. Como voltar no tempo e dar de cara com um prazo de validade que invalida a realidade. E o odor da velhice aureolando tudo. Cobertores, colchões, travesseiros, tudo molhado e seco do suor da chuva as inúmeras vezes em que o tempo, repetindo-se, permite. E que as goteiras e infiltrações da laje carcomida pela água das tempestades permitem. E que o descaso revigora, sendo a lenta deterioração uma circunstância que tem sua causa no fato de que ninguém realmente se importa ou incomoda com as dores da pedra, da areia, do cimento. E tantos livros amarelando lentamente sobre o balcão do defunto, enfileirados como condenados à morte por alguma junta revolucionária sem sentido. E as garrafas de vinho vazias num canto, postadas em pé, pequenos moais da embriaguez. Tudo se estendendo na vertical, coluna vertebral, como se espreguiçasse, esperando. Julho de 1997 – quanta coisa não aconteceu depois disso?
Eu não aconteci.