Nada, Nada, Nada
Daria o nome de cancro se não tivesse a impressão de que o que sinto é inominável. Meio que uma sensação de derrota pungentemente indelével. Derrota cujo vencedor sequer existe. Caso não seja uma batalha comigo mesmo. Porra, sei lá! Um vocabulário imenso disponível e as palavras não saem pra definir essa desgraça, dar um norte, um sentido-placebo que seja, só para que eu possa seguir em frente perseguindo essa cenoura atada à vara de pescar que tenho socada onde o sol não bate e que se curva diante de meus olhos. E sempre ali, em letras garrafais vermelhas, piscando, piscando, a palavra suicídio. Sedutora. "Vem". Sedutoríssima. Aí eu penso no quão fácil é deixar de respirar que a possibilidade de perpetrar o ato, de fato, se torna insossa. Passo a ponderar: olho os seguranças de porta de puteiro e penso: nunca comi uma puta. Vejo os tiozões jogando baralho no bar e penso: nunca aprendi a jogar baralho. Quanta coisa eu não fiz. Quanta coisa eu não fiz? Digitar senhas de bancos/sistemas, pintar quadradinhos de planilhas, tirar cópias, dobrar folhas, carimbar folhas, fazer contas, cortar papéis, colar papéis - tudo o que sei fazer. Tudo o que faço - enquanto a abóbada celeste resplandece um azul profundo e dentro de mim um conta-gotas de ácido sulfúrico goteja sem parar em cima da minha vontade de viver – não é meu, não é pra mim, não é por mim. É tudo pelo amanhã que não peço pra ter. É tudo para que o sentido se mantenha distante e indistinto. E é tanto vazio pra me encher que não sobra espaço pra mim. Não sobra nada pra mim. Nada, nada, nada.
13/02/2013 - 22h00m
Seabright - Ear Mark