Educação

Educar é uma das ações humanas mais importantes que existem. Não é nada simples, é ao contrário deveras complexa, intricada e imprevisível no seu todo. Educar não é catequizar ou adestrar, se o fosse seria pura e simplesmente muito mais simples. A catequese limita, bitola, freia a curiosidade, restringe o livre pensar, e torna-nos fracos e repetidores, alvos diretos do domínio que interessa ao sistema politico e econômico, o adestramento ao seu turno torna o ser em preparo um mecânico ator do sistema, sem maior iniciativa, criatividade ou de novo sem a curiosidade que é a mãe da busca e da descoberta.

Entendo que o educar, ao contrário, deva, natural e obrigatoriamente, ter um viés de preparar o espirito mental juvenil, do ser em crescimento físico e humano, para este velho mundo no qual experimentará seu viver humano, politico e social, permitindo assim a estes novos viventes, em crescimento, a capacidade de buscar alguma transformação, transformação esta não diretamente construída pela educação, não decorrente diretamente da educação, da catequese ou do adestramento, porem fruto do contínuo fluir de novas mentes, abertas ao novo e ao que possa ser ousado, de seres viventes livres, conscientes de seu papel social, amantes da vida, do bem estar social, da dignidade humana e também amantes de nosso planeta. Para isto a educação é o preparo, e não o motivo, é o caminho e não a transformação em si. Não espero da educação transformação, e sim a capacidade de preparar transformadores, seres que com respeito, amor e envoltos em conhecimento multidisciplinar, bem conceituado e firme, com mentes críticas, racionais, ousadas e pensadoras levem a vida humana a um patamar cada vez mais digno de sua humanidade.

Educar é um ato vivo, múltiplo, diário, que deve renascer continuamente, pois ainda não acabamos de educar algumas crianças e jovens, e outra leva de pequenos seres humanos, ávidos pelo viver, já está nascendo. A força da educação, a meu ver, não está na doutrinação ou no direcionamento, mas sim em ser capaz de abrir horizontes, em criar povos repletos de humanidade, em mostrar que a diversidade é sinal de força e de vida, que a padronização intelectual ou de princípios leva ao ostracismo e a mesmice, na miscigenação das diferenças, com certa liberdade e muita consciência dos limites e dos direitos dos outros cria-se uma sociedade dinâmica, forte, plural e sinérgica onde a soma de seus componentes individuais do viver resulta em algo maior, resulta em uma sociedade mais forte e preparada do que a simples soma algébrica direta de cada um de seus membros (O todo será sempre maior que a soma das partes, porque algo que não existe no individual surgirá emergindo da própria complexidade desta multiplicidade de opostos). A força da educação não está em catequisar ou adestrar, em estar a serviço dos interesses políticos, dogmáticos ou econômicos de quem quer que seja, de qualquer instituição, ou mesmo de religiões ou grupos seculares, mas sim em preparar para fazer do velho mundo algo que possa ser novo, sem abrir mão de conhecimentos e saberes bem estruturados e com habilidade para ler e compreender o velho livro da vida com novas leituras de um novo possível mundo, antes de simplesmente levar uma vida reativa, submissa ou omissa.

A educação deve ser completa, não deve estar a disposição de doutrinações, quaisquer que sejam, mas não deve também, em nome de qualquer liberdade, ensinar mentiras ou falsidades, ou mesmo esconder e omitir as verdades, por mais feias que estas sejam. Em lugar nenhum está escrito que a verdade deve ser bela, existem muitas mentiras belas e por elas chegamos ao estado atual, onde somente uma verdadeira educação pode permitir a gerações futuras viver neste mundo velho com novas leituras. Uma criança criada em mentiras e omissões acabará em algum dia, do seu presente a viver, a bater de frente com estas mentiras e sofrerá muito mais, e se verá incapacitada de se transformar pois estará presa a vícios e a um doutrinamento já feito. Um espírito que não conhece a verdade é um espirito frágil, dogmático, preconceituoso e que acabará por aceitar pseudociência como se ciência fosse e manterá o credo de que a vontade e o desejo sejam eles próprios verdades. Por isto que educar é importante e nada simples.

É necessário impor limites aos excessos das crianças, sem que isto limite sua alma e sua ousadia de questionar e de repensar os limites do que aqui está, do que hoje é limite do saber e do conhecimento, do que hoje é comportamento digno, e isto em todos os sentidos, mesmo e principalmente aqueles tido como dogmáticos ou universais. De universal temos apenas os direitos a vida e a busca da felicidade, sendo ético e moral tudo aquilo que dignifique o viver, e que maximize a felicidade por um maior número de pessoas possíveis, mesmo que vá de encontro a livros místicos, sagrados ou doutrinas sociais implantadas. É necessário proteger sem sufocar ou limitar, é necessário sociabilizar sem que a criança se perca de si mesma, de sua importância individual frente ao grupo, e passe a ser marionete ou massa de manobra da ditadura da maioria. Uma criança tem de aprender a ser única sendo parte do todo, e a ser social sendo única.

Me desculpo com os professores e pedagogos, compreendo suas tarefas como sendo de uma importância absurda, mas mesmo não sendo eu professor ou pedagogo me sinto no direito e no dever de questionar e criticar a educação. Quem foi que disse que apenas os professores ou pedagogos são capacitados para teorizar, criticar, propor ou opinar sobre educação. Entendo que principalmente os professores, mas também os pedagogos são profissionais humanos de suma importância na corrente da educação, mas a educação como um todo é de responsabilidade de muitos, também dos pais, dos amigos, da sociedade, do poder politico, dos legisladores, dos psicólogos, em especial os cognitivos, e mesmo dos neurocientistas, pois educar é em última análise trabalhar a mente de um nova geração, e a mente nada mais é do que a emergência natural do complexo sistema neural.

Como pai e maior interessado na educação de meus filhos, me vejo também assim autorizado a falar sobre educação. Apenas como escopo de minha atuação, durante a infância e a juventude de meus filhos jamais abri mão da responsabilidade pela educação de meus filhos, delegando a quem quer que seja, escola, professores ou pedagogos, por melhores que eles fossem, a responsabilidade pela educação de meus rebentos. Em relação às escolas e aos professores, que muito respeito como profissionais e instituições, e tive a grande sorte de conhecer brilhantes profissionais de ensino nas escolas que meus filhos passaram, dividi com estes alguma responsabilidade pela instrução e pela sociabilização de meus filhos.

Os professores são elos vitais no processo vivo de educar, mas o sistema, em geral, não preza necessariamente a valorização, seleção e preparo destes profissionais, e acaba permitindo que alguns professores despreparados assumam esta importante tarefa de responsabilidade enorme para o presente e para o futuro com os alunos, sem um preparo e competências maiores.

A Sociedade não pode se calar quando o sistema não está focado e preparado para um sistema educacional completo, mas sim preparando-se para resultados duvidosos desde que apontem para índices que mascarem a verdadeira tarefa de educar. O sistema não pode achar que basta treinar nossos filhos, como que adestrando-os e os fazendo decorar o que deveriam entender, e por si só, assim, fazem uma abordagem “uni-disciplinar” que não faz sentido lógico para os alunos, criando alienados culturais capazes de saber sem compreender, e isto vale também para as universidades.

Defender unilateralmente que o aprender somente se completa e se conclui, que o aprender só se constrói e solidifica pelo fazer, como que um ato pragmático de que aprender seja unicamente adestração e atingir índices, que somente se edifica quando praticam e fazem, ou que o aprender deve ser deixado livre para que cada um aprenda conforme seu ritmo ou capacidade é brincar de educar, é minimizar a importância do mestre, é acreditar que um jovem partirá da matemática elementar para a descoberta do calculo diferencial e integral apenas pela descoberta e curiosidade, pode ate ser que uns raros exemplos de genialidade precoce assim o façam, mas o ensinar deve conter uma grande porção de transferência de saber, com criatividade, motivação e provocação intelectual, abrindo assim a curiosidade do corpo de alunos. Dar a educação o caráter de doutrinação e adestração que pode fazer interesse a alguns, mas que não faz nada pelas crianças e pelo futuro deste velho mundo, onde apenas pode perpetuar o estado do que aqui está, é perder a oportunidade de verdadeiramente educar. A educação séria permite um novo repensar do mundo. Professores e pais deste mundo lembrem-se sempre da importância de vocês não somente para as crianças, mas para as sociedades vindouras.

Um professor deve ser selecionado por um conhecimento elevado na disciplina em que ministrará aula, e também na inter-relação de sua disciplina com outras áreas do saber. Deve também ter um preparo pedagógico que o distinga dos comuns, deve possuir uma didática motivacional e um poder de autoridade nascida não por ser adulto ou meramente professor, mas uma autoridade pelo seu saber destacado.

Infelizmente o sistema educacional em voga não preza como um todo em selecionar professores com saber destacado e profundo, e assim alguns professores que não possuem vastos e profundos conhecimentos acabam muitas vezes sendo professores de nossos filhos, não tendo muito mais conhecimento, as vezes, que os nossos próprios filhos.

Professores deveriam ser uma espécie de semi-deuses, muito bem remunerados, muito valorizados, e muito bem treinados nas técnicas de repassar conhecimento, e assim dever-se-ia exigir deles profundo conhecimento e didáticas que motivem e não que distanciem os alunos do prazer do aprender.

Entendo e percebo que alguns professores, a maioria das vezes por culpa das faculdades autorizadas a ensinar que preparam um futuro professor sem maiores conhecimentos sólidos, se esforçam em preparar aulas e estudar antecipadamente cada aula, mas outros, por diversas razões, entre elas o desprestigio, a baixa remuneração, a sobrecarga avassaladora de tarefas devido a turmas inchadas em excesso, a turma que já chega até ele sem nenhum conteúdo maior aprendido, a pais que não valorizam o aprender e veem nas escolas mero repositório “seguro” para seus filhos, estes professores não conseguem suprir a carência e a motivação ao seu corpo de alunos, e acabam perdendo assim seu grande diferencial de autoridade, que é o de saber muito a sua disciplina e sua capacidade didático-motivacional. Ao perderem sua autoridade de mestres, que os alunos logo percebem, muitas vezes transformam essa carência de autoridade em um poder formal, aquela da autoridade intimidadora, do quase terror com punições e sustos. Não estou dizendo que o professor não deva punir educacionalmente seus alunos, sim, sou a favor de testes como forma de medir o aprendizado, infelizmente não conheço outro método de saber se meu filho está atualizado com o que deveria ter aprendido, mas a prova não deve ser o terror dos alunos e sim um culminar de um aprender, assim como uma demonstração de superada mais uma fase, e assim deve ser também a prova uma motivação, não aquela de uma competição desumana, mas aquela que oferece um prêmio e um prazer de ter a certeza que valeu a pena ter estudado. A troca da autoridade do saber pela autoridade formal e física faz das aulas um horário nada nobre ou sadio, as vezes se transforma em um horário de terror e pressão psicológica insuportável para o alunato.

Por sorte, professores ainda são nobres, e apesar da carência politica que não os valoriza, eles ainda são, muitos deles, abnegados preparadores da mente de nossos filhos.

Um professor deveria ser visto como um ser humano e profissional quase sagrado, assim como um bom pai ainda o é, um bom professor deve ser valorizado e respeitado, deve ser referência em um país sério que deseja fazer a diferença no futuro. Infelizmente a sociedade e o modelo politico não valoriza realmente a educação e é normal que assim o seja pois a politica é reflexo direto de nossa sociedade que nada faz para mudar isto.

Aprender deve ser algo que faça sentido dentro das vidas de cada um dos aprendizes, deve haver um paralelismo entre o conteúdo programático e a vida em si, mas deve mais haver uma multidisciplinaridade e uma didática motivacional que abra a mente a curiosidade do aprender, deve ser perpassada de profunda conceituação e interpretação, de integração entre os saberes e o viver, e deve ser repleta do porque se está aprendendo algo. O contexto do aprender deve sempre ser alargado e deve se referência a algo existencial ou principalmente material. A educação é uma tarefa material, não é no campo idealista que a educação deve buscar sua essência e sempre que possível deve fazê-lo no campo da realidade imanente que o jovem vive e conhece. Não adianta falar em aceleradores de partículas em uma classe que os alunos mal sabem o que deve ser um átomo. O bom professor deve ser capaz de saber o nível introdutório que deve praticar e buscar meios, em parceria com a turma, para elevar e alargar continuamente o campo do saber desta turma.

Para um bom professor o educar é sempre uma via de dupla mão: “aprendo enquanto ensino, e ensino melhor porque aprendo”, isto vale também, ao meu ver, para os pais.

Por mais que algumas frases sejam lindas do ponto de vista idealista, como aquela de Gandhi de que: “Não existe caminho para a paz, que a paz é o caminho”, um professor sério não pode passar esta visão “idealística”, pois na realidade a PAZ é um estado, é um fim, e não um caminhar, assim devem existir sim caminhos para a paz, e a educação é um deles, a capacidade de viver em sociedades plurais, em acabar com preconceitos e segregações, em incluir socialmente a todos, a valorar todos, próximos ou distantes com o mesmo valor humano, a aprender a se colocar no lugar do próximo e etc., assim a paz é possível por caminhos múltiplos, paralelos, e convergentes, mas a paz por si só é um alvo e não um caminho, por mais que tenha sido bela a luta do grande Gandhi.

Assim entendo, como já repedidas vezes expus ao longo do texto, uma nobre tarefa que deve ser dividida entre muitos, e onde os pais e os professores são atores de suma importância para o atingimento de uma educação completa e digna deste nome.

Arlindo Tavares
Enviado por Arlindo Tavares em 11/02/2013
Código do texto: T4134689
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