Manifesto de véspera de carnaval

A vida é mesmo engraçada. Passamos a metade dela tentando impressionar as pessoas, provar que somos capazes, construindo uma reputação, juntando coisas, até descobrir que nada disso possui qualquer valor. Não era a busca certa. Entramos com a fantasia de carnaval em plena Missa de Quarta-feira de cinzas! É tanto desajuste, que chego a me perguntar: eu quero ser bom. Por que os outros simplesmentes aceitam essa índole e me deixam ser feliz do meu jeito? Por que é tão difícil agradar?

E de tropeço em tropeço seguimos pela vida. Caminhamos prá lá e para cá nessa estrada, juntando pequenas verdades, sem saber direito aonde elas irão levar.

Velhas amizades, que se diziam tão essenciais na adolescência, onde estarão agora? As juras de amor eterno, quanto duraram mesmo? Não. Nem posso exigir tanto. Pelo contrário. Quem foi para longe fui eu, Com uma dúzia de mudanças (de residência, de estilo, de profissão). Merece um prêmio quem continuou meu amigo. Mas já são poucos. E as amizades recentes que poderiam (e deveriam) substituir as antigas, não passam de promessas, de sementes à beira da estrada. Não crescem. Não criam raízes. Morrem com pouco tempo. Estou ficando rabugento, avesso à qualquer qualquer outra coisa que não ofereça garantia de que vá durar mais de um ano. Dá para se viver assim, tão improvisado?

Sonho com o dia em me sentirei plenamente integrado ao meu habitat. Qualquer que seja ele. A idéia da novidade não me prende. O problema não é o bairro. É um pouquinho mais além. Tem a ver com a situação e o contexto em que os encontros e as necessidades surgem. O homem é um ser social. É só relaxar e deixar a antropologia se manifestar! Em tese, o ajuste entre indivíduo e o coletivo viria naturalmente. É para isso que existe o Carnaval.

Se nem desbotadas amizades, nem lembranças em preto e branco. Não dá mais para levar nos bolsos. O jeito é seguir leve, procurando. A Busca de nós mesmo, do nosso passado, do que éramos e hoje não somos mais. Busca pela força invisível, das metas impossíveis, do sucesso retumbante, da admiração irresistível, do gol de ouro, da beleza inconteste, do futuro promissor, de tudo o que deveria ser e ainda não sou. Uma busca infinita, portanto, se não fosse pela morte.

Assim, toda filosofia, ciência ou religião se resume em tentar descobrir o sentido e o "peso" do que se situa entre o início e o fim da existência. E por acaso alguma explicação chega a preencher o vazio dessa confrontação? Entre o real e o que pensamos a respeito?

Não é injusto. A consciência pode ser o "fiel da balança", uma bússola na jornada. Mas tem a televisão, a internet, os joguinhos e tanta distração. As questões essenciais vão sendo adiadas pelo noticiário das 8h, das telenovelas, dos seriados. E de lenientes em lenientes, a gente vai tocando a vida. E amanhã é Sexta-feira de Carnaval! É alegria chegando, minha gente! Se alguma resposta existe, certamente terá de esperar o frevo e o bloco passarem. Até quando?