Desculpe a ausência
Desculpe a ausência.
Mas pelo tanto de caminho que tenho passado, sinto e vejo que tenho sido ausente de tudo
eu tenho sido ausente de mim
acostumei-me a não pensar
o que é mais fácil
pra não ter que sofrer a dor de pensar o que não devo
pra não sofrer a dor de não ter o que não tenho
pra não sofrer
apenas
no entanto eis que hoje
abobalhadamente sentado enquanto este avião plana entre os ventos
e chacoalha incessante
essa carne amorfa que descansa entre meus dedos
e enquanto Deus brinca de desenhar
icebergs nas nuvens
e pontes que levam ao nada
eu, aqui do alto
lembro
lembro
lembro
e dos teus olhos descem raios faiscantes
dos teus lábios, bálsamos para todas as minhas dores
e de tua misericordiosa presença ausente
laços se fazem novamente
e nos unem num eterno nunca
eu, carne inerte acordei
como lázaro de sua tumba
vem pra fora
e chamaste o meu nome
e em nome do amor eu vim
desce, pois, agora o teu olhar sobre o meu
e brilha e resplandece e reluz em mim
ó sol da minha existência
desce os teus lábios ausentes sobre os meus e me ama
com os olhos apenas
com os olhos apenas