"AERODROMOFOBIA"

AERODROMOFOBIA

Quando pequena, ao olhar para o céu e ver passar um avião, eu perguntava a meu pai:

- Pai, o senhor já viajou de avião? Deve ser tão bonito... A minha amiga Marli já foi a Portugal e disse que, quando o avião passa por cima das nuvens , elas parecem algodão...

- Não, filha. Nunca precisei viajar para muito longe, mas, mesmo que precisasse, não poderia porque a passagem é muito cara...

- Que pena... Eu gostaria tanto!...

- Quem sabe, um dia... Você vai crescer e poder viajar de avião, hem?...

Na infância e até a idade adulta, nunca tive medo ou fobia de qualquer espécie. Até, pelo contrário, sempre fui afeita a pequenas aventuras, digo pequenas porque, naquela época, nossa vida modesta e erário também, com reduzidas formas de atividades esportivas, mas que hoje fluem em todas as esferas, como esportes radicais : asa delta, escalagem nas montanhas, passeios pelas matas e cachoeiras e, o menos radical, futebol feminino que, na época, ainda não existia, ou se existia, nunca ouvi falar... O máximo que podia desfrutar eram dos exercícios, no ginásio como: corrida rasa, de estafeta e um sofrido time de volley do qual era capitã e dele me orgulhava, apesar das derrotas constantes no enfrentamento com escolas bem mais preparadas como Instituto de Educação, Escola Orsina da Fonseca e outras mais que não me lembro...

Todavia, tinha um esporte que, volta e meia, praticava: eu e meus irmãos, o Lolo, o Élio e o Manoel, quando não tínhamos aula, pegávamos um trem da Central do Brasil, hoje, Super Via até o Centro da Cidade e de lá, um ônibus para a praia vermelha. Lá, naquela praia tranquila, tive oportunidade de aprender a nadar, olhando o movimento de braços e pernas dos banhistas... Não tinha lá muita técnica, mas conseguia manter-me nadando até me cansar, quando, então, virava de barriga para cima e boiava tranquilamente...

Hoje, aos setenta e oito anos, posso dizer que fiz algumas viagens aéreas, sem que me passasse pela cabeça qualquer perspectiva de acidente...

Entretanto, a cada dia , inúmeros acidentes aéreos acontecem ; aí voltei às lembranças de meu pai. Ele era exotérico e, numa das vezes em que leu o meu mapa astral, disse que eu viveria muito, mas que a minha morte seria em circunstância trágica... Eu tinha quinze anos e não dei a mínima para o tal presságio, era jovem e saudável; por que iria preocupar-me com bobagens?

Atualmente, mudei de pensar e , embora não sofra de aerodromofobia (medo mórbido de viagens aéreas), repensei sobre os acidentes que sofri ao longo de todos os anos da minha vida, analisei a todos sob o aspecto da periculosidade de cada um e deduzi que em alguns poucos, eu poderia, até, ter morrido... A impulsividade, às vezes, nos leva a desafiar a nossa capacidade de realizar algo mais difícil... Em vista disso, resolvi que não viajo mais de avião... Quem sabe se, numa dessas viagens, o presságio do meu pai se realiza e eu sofra o meu último acidente?... Então, é por isso que, de uns anos para cá, comecei a pensar sobre o meu futuro... Quantos anos ainda viverei?... Ninguém consegue saber, claro! Por via das dúvidas, passei a me policiar, procuro não arriscar-me a fazer nada que a minha idade não permita... Que a minha morte seja tranquila, que esteja lúcida para poder despedir-me da minha família e levar comigo a imagem dos rostos que mais amo, mas sem choro...

Caros amigos, não pensem que essa minha narrativa seja uma despedida ou coisa parecida; tenho amor à vida e pretendo vivê-la plenamente, enquanto minhas limitações me permitirem... Tete Brito

Tete Brito
Enviado por Tete Brito em 26/09/2012
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