banalizar
Eu queria entrar numa padaria qualquer dia e pedir uma xícara de chocolate quente, arrumar a gola do casaco e, no meio da correria para chegar no horário, olhar pra baixo e encontrar em minhas mãos um pouco de poesia barata. Nem que estampem o saco de pão, nem que rasguem as propagandas políticas dos cartazes e coloquem um letreiro reluzente só pra pedirem um sorriso da moça de Black Power do outro lado da calçada. Nem que banalizem Carlos Drummond. Nem que ouçam crônicas nas rádios com batida de música eletrônica remixada. Eu só queria o sorriso bobo dos dois caras de mãos dadas cruzando a esquina e um bom motivo para atrasar dez minutos. Um bom motivo para correr, pra não dormir essa noite, um bom motivo pra gritar aos quatro ventos aquele seu refrão de música favorito.
Queimem as propagandas, sorriam nas capas de cigarros, e chorem nos anúncios de absorvente intimo. E claro, acima de tudo, banalizem a leitura. Antes que faltem sorrisos, ou pior, que faltem os choros. Antes que lhe falte tudo. Antes que lhe falte até mesmo a vontade de encontrar motivos que comprovem: Você não precisa de motivos pra nada.