Me desculpem por gostar de chocolate. E de batata frita. E me desculpem por amar chocolate com batata frita. E, claro, me desculpem por não usar manequim 38, nem pesar 50 kg.
Desculpem eu ser eu.
E me desculpem se vocês não conseguem ser vocês.
Se vocês são fracos demais pra admitir os próprios erros, e se são incapazes de perdoar a si mesmos.
E me desculpem se, por isso, vocês tiveram que passar a vida inteira sendo o que não são. Ou não sendo o que são.
E eu sinto muito! porque medos e verdadeiras identidades não podem passar tanto tempo engavetados sem causar sérios danos.
Então, me desculpem se eu exponho meu medo. E se isso me faz parecer fraca. Mas aprendi que quando sou fraca, então é que sou forte. Me desculpem, também, por acreditar nisso.
Me desculpem se eu não uso máscaras. A cor do meu cabelo pode até não ser natural (e me desculpem até por isso), mas nem isso esconde em mim o que eu sou. Me desculpem. Me desculpem se eu falo o que penso. Aliás, me desculpem por pensar. Por não seguir multidões. Por ter pernas e opiniões. Por duvidar e questionar e até inventar novas formas de ver e viver e sentir e conviver. Mê desculpem por sentir.
Me desculpem por usar decote e ter as pernas expostas e usar batom vermelho. Nossa, que puta eu sou! Me desculpem por isso também. Me desculpem, inclusive, por ir à universidade e à biblioteca todos os dias. E me desculpem se isso faz de mim uma vadia. Eu sinto muito por tamanha ofensa.
Me desculpem por gostar de chocolate. E de batata frita. E me desculpem por amar chocolate com batata frita. E, claro, me desculpem por não usar manequim 38, nem pesar 50 kg.
Me desculpem por insistir nos meus cachos. E por amá-los. Eu, realmente, sinto muito não ser mais uma adoradora da chapinha nesse mundo.
Me desculpem se o carro dos meus sonhos é um Fusca 1970. E por ser o único carro que eu consigo reconhecer quando vejo. Me desculpem, me desculpem se eu não nasci com o gene ‘mania de grandeza’. E por não achar dinheiro e luxo tão importantes assim, como toda pessoa normal deve achar. E me desculpem por nunca, jamais ter pensado em engravidar do Neymar. Me desculpem por não ser tão inteligente.
Me desculpem se a minha maior ambição na vida é, de verdade, um lugar de mato verde pra plantar e pra colher, uma casinha branca de varanda, um quintal e uma janela para ver o sol nascer.
Me desculpem por não fazer do casamento a razão de todas as minhas ações. Me desculpem, inclusive, por não sonhar com casamento. Algumas pessoas são inteiras quando estão sozinhas. Me desculpem por ser uma delas. Me desculpem se eu não preciso de uma metade, se eu não sou uma laranja.
Me desculpem pela insanidade de querer ter uma casa cheia de filhos e bichos babando e correndo e alegrando a minha casa. E me desculpem se vejo na adoção uma maneira bonita de ter meus filhos. Eu vou lamentar demais caso vocês não queiram abençoá-los só por não terem crescido dentro de mim. Me desculpem por vocês serem tão preconceituosos.
Me desculpem por eu ser diferente. E por não querer mudar por vocês, nem ser igual a vocês. Me desculpem se, a cada dia, me afasto mais de vocês por não me aceitarem inteira. Eu não posso ser digerida porque não sou fragmentária. Então, me desculpem pela indigestão que posso lhes causar.
Me desculpem por aceitá-los exatamente como são. E por dar minha opinião quando me pedem. Eu sinto tanto por não falar exatamente o que querem ouvir.
Me desculpem por sempre levantar depois da queda. Eu adoraria satisfazê-los com meu fracasso, mas levantar é sempre meu instinto. Me desculpem por decepcioná-los de tal maneira.
Me desculpem por amar mais os animais que os seres (des)humanos. Me desculpem por não comer animais, aliás. Nossa, como eu posso ser tão covarde e egoísta a ponto de não comer animais? Me desculpem por ser assim, tão insensível!
Me desculpem se o cara que me beija não é bom o bastante pra vocês.
Me desculpem se eu não sou boa o bastante pra vocês.
Me desculpem se vocês conseguem viver bem sem mim.
Me desculpem por partir.
Me desculpem por vocês não conseguirem me perdoar.
Desculpem eu ser eu.