A colcha que me envolve
Sinto como se escondessem algo de mim. Como se houvese um segredo que pessoas partilham e que eu ainda não sei. Não sei nem se um dia saberei. É como uma força que impulsiona pra que eu sempre tenda ao não saber. E a culpa deposito em outros. Me escondem do mundo real, da verdade que existe por trás das palavras não ditas, dos atos não consumados. Hoje é mais um dia daqueles que vou deitar em minha cama e chorar lágrimas vazias, implorar piedade aos céus e dormir. É como mais uma noite passada em branco. Mais uma madrugada em que não tenho nada além de um travesseiro e a colcha que me envolve.
Reflito. As pessoas que eu penso que me conhecem, na verdade não sabem nada sobre mim. Não compartilham da minha dor, dos meus dias brancos, das minhas madrugadas vazias. Não compartilham dos meus dias felizes nem de minhas horas plenas. Porém, me contam a vida e seus segredos mais pessoais, e ainda assim não conhecem os meus. Não creio que seja por falta de interesse meu em compartilhar. Mas sinto que falta interesse da parte deles em conhecer. Falta interesse em me conhecer de verdade.
Quando não estou bem, esperam que eu esteja para que eu possa suportar a demanda que me despejam. Para que eu possa escutar seus males e angústias, acolher e solucionar algo que não é meu. Se eu não estou disposto a ouvir, botam a culpa em uma frieza ou egoísmo que não possuo. Botam a culpa em uma falta de interesse minha em recebê-los em minha vida. Não é verdade. Por outro lado, quando me perguntam o que tenho (raras vezes), logo respondo: "Está tudo bem". O que há de errado comigo? Fujo ao ver a mínima faísca de um suposto interesse? Mas, me pergunto se não passa de uma pergunta rotineira. "Ah, porque ele sempre está bem", "Ele é uma graça de pessoa!", "Está sempre com um sorriso no rosto". Talvez eu tenha um escudo que mais me prejudica do que me protege.
Vivo em função de outros. Sou mesmo uma pessoa solícita, companheira e atenciosa. Acontece que quando eu sou aquela pessoa que demanda, que tem uma dor e quer compartilhar, só me resta a mim mesmo, os céus, o meu travesseiro e a colcha que me envolve. Aqueles a quem ouvi e acolhi, somem, voltam para suas vidas e suas próprias dores. De que reclamo? Dizem que nascemos sozinhos e morremos sozinhos. E o viver? E o conviver? Sinto que, ainda que eu esteja rodeado de rostos conhecidos, família e amigos, ao final do dia estou sempre só. Vou dormir só. Acordo só. Sou só. E só. Até quando?