Entre figos e felicidades

Era final do dia, e eu estava no balcão d'um cartório cível aguardando atendimento, quando assisti a um escrevente se despedir do colega, aos votos de um saudoso (e sonoro) "boa noite". Por continuação, jazeram a prosa: "Como é mesmo que se fala?" - bradou ao se levantar, aquele que partia. Mais um dia a menos! Menos um dia disto, e logo A-Aposentadoria! - retrucou o que ficava, ratificando seu desconsolo de alma e de amargura, transpostos no olhar.

O tédio de espírito dos locutores que observei fedia a enxofre em pó (e olha que não conheço o cheiro de enxofre em pó), e isto me embalou na dúvida: Será que vai acontecer comigo? Será que deixarei minh'Alma estocar louvores e feder a mofo, assim? Será que é saudável que a sociedade (lembre-se, constituída por pessoas) se divida em felicidades que estão condicionadas a datas, épocas e finais de semana?

Nunca balbuciaremos o cúmulo da alegria e do entusiasmo se continuarmos a ver contenda entre segunda, e sábado-feira. Qual a diferença entre os dias? Eles não se dão por bem, por acaso? Bem, dos sete dias da semana, apenas dois estão no fim. Devemos nos alegrar apenas nestes?

Perceba como os dias são curiosamente iguais, estando um para com o outro, e que é possível ter a mesma continuidade de sorrisos cumprindo a rotina da terça, assim como exasperando a juventude de espírito, no sábado. Os dias mudam, mas você não.

Juro que estas palavras me deixaram afoito, e ainda titubeiam como badalos num coração jovem e esperançoso, como o meu, para quem os dias não são diferentes, como o meu, para quem as almas gorjeiam (não des!) contentes, como o meu; para quem o mundo é mais que um cartão de ponto, assim como o seu.

Dia a mais, ou dia a menos, a humanidade perceberá que a essência da contemplação de Universo é muito maior que esta comezinha intuição de alegria em datas, calendários e feriado. A felicidade é uma conquista, antes de uma emoção momentânea e evasiva. É um sentimento e uma sensação uníssona, e Una.

Ela foge-te dos dedos, se não te põe os brotos. Foge-te dos lábios, se não te bebes da Fonte. Foge-te dos braços, se não a empunhas direito. Foge-te da figueira, se não te lambe os figos. Foge-te da vida, se não a vês com clareza. Viva a segunda-feira.

Alexandre Bonilha
Enviado por Alexandre Bonilha em 02/07/2012
Reeditado em 05/07/2012
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