Ill Again

A sonhar com invasões noturnas de cemitérios e com cassetetadas de policiais da ROTA na cara, atravesso essa madrugada. Acordado, lúcido, sou um resumo da dor que contorções intestinais são capazes de proporcionar. Acordado, no escuro, no silêncio da madrugada, halos de paranóia flutuam na minha retina; completos esquetes ilusórios que se amalgamam sempre com a realidade. De novo mais do mesmo. Novamente outro erro. Outra sucessão de lamúrias e mendicâncias. Apenas o ser humano sendo o ser humano: apenas um animalzinho, segundo Santo Agostinho, em busca de prazer e em fuga da dor. Apenas meu espelho refletindo o que eu não quis ser e fui. E sou. Na dominical tarde morna de brisa fresca, de céu azul límpido de nuvens, na fila de um hospital público, espero pela inserção intravenosa de medicamentos que me darão sono. Há benção na doença: dorme-se para amainá-la e esquece-se a vida no mesmo pacote. Um avião sobrevoa aqui. Fitas de plástico - rabiolas, resquícios de pueril felicidade - dançam nos fios elétricos. Uma folha morta rola pelo pátio de cimento liso queimado. Os raios de sol através do cano de plástico por onde desce o soro e sobe meu sangue. A morte a galope: uma dádiva numa vida que trota com elegância em solo espinhoso.

01/07/2012 - 13h50m

Rafael P Abreu
Enviado por Rafael P Abreu em 01/07/2012
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