Entre paredes

Em meu quarto existem quatro paredes. São muralhas que limitam meu horizonte e ocultam a frieza em meu olhos, um amargo desconhecido em minha boca saliva a vida com desperdício, e em minhas idéias, um vazio aplica tons de cinza naquilo que era belo e vivo.

Dentro desse espaço de existência, sinto-me perdido, exilado pela individualidade que a arrogância inflige à minha alma. Parece tão difícil tentar entender aquilo que estamos dispostos a penalizar. Gritamos sobre liberdade, buscamos o refrigério em alívios inconstantes de consciência, porém, temos prisioneiros no coração, subjugados por um ego faminto e agressivo que não sabemos controlar.

Vamos diminuir o mundo para nos sentirmos maiores?

Muita coisa se pode dizer desse espaço. Há vozes que ecoam e atormentam com a verdade aqueles que se escondem com mascaras da mentira, e em busca de encontrar um sentido para a face disforme que vêem no espelho, admitem no silêncio acatar somente aquilo que é relevante. Esse egoísmo é nossa outra transformação. Enquanto observava o "nada", essa metamorfose do caos, imaginei que pudesse existir portas, porém, não estavam lá porquanto não queria vê-las. Estava trancado, vítima de todos os horrores da solidão. De espectador ocioso, passei a personagem principal no drama da vida, colocando em balanças enganosas pesos e medidas que inventei para justificar meus atos. Acho que fugir um dia vai me matar. A tirania da opinião injetava seu veneno no bom senso e tudo passava a ter somente uma única ótica.

Essas paredes enregeladas revelam o prisioneiro dentro de mim, exagerando em palavras a a fim de ocultar os pensamentos. E no que se poderia basear uma vida visto que o amor nunca esteve tão maculado pelo egoísmo?

Existem pessoas comuns, que se apoiam nas pontas dos pés a fim de contemplar o destino, e em suas buscas incansáveis, o esplendor apaixonante do horizonte aparece; porém, o desgaste dos músculos e a dor lembram o sacrifício que a perseverança exige. O futuro se apresenta como um preço alto, onde os compradores aprendem sobre prudência e simplicidade. Negociam a personalidade. De repente, acreditar na mudança dos ventos comprometeu a liberdade do ar, acuado pela pressão das expectativas. Moldamos as coisas de forma que tomam nossa forma; e somos duros como rochas que se recusam a mudar.

As paredes, muitas vezes, relutam em alterar seus planos. Manipulam e dominam, recusando-se a negociar com a liberdade. Paredes pétreas, refúgio de maus pensamentos... por que insiste em ser tão inflexível?

Por um tempo andei me debatendo inutilmente, agora, não sou mais que um homem calado. A natureza humana não pode ser dominada. Chega o momento em que a necessidade de transformação com sua mão de ferro decide dobrar a vontade de seres mortais, expondo a força do egoísmo, reduzindo-o a um lugar em ruínas. Acredite, aceitando ou não, todos temos texturas disfarçando nossas paredes para que o mundo não veja as manchas que desvalorizam quem somos. Queremos aceitação, aprovação e apreço a qualquer preço. É uma essência mórbida proveniente do acúmulo de opiniões pré-estabelecidas. Um paradigma torna-se um conselheiro que nos levará ao escuro. E quem pode nos dizer a verdade quando não queremos ouvi-la?

Você alguma vez já ouviu as vozes? Talvez. Só são reais quando queremos ouvi-las. São suaves, e as boas se misturam às ruins. É natural tentar escapar por cima, transpor oi teto de chumbo sobre nossas cabeças, já que evitar a frustração e encontrar prazer se tornam os pilares duma vida egocêntrica. Quem não pensa primeiro em si mesmo? Limitei essa deficiência somente entre as quatro paredes e entre elas coexisto com mais um monte de coisas que não se definir. Não permito que a humildade me arranque de lá. Não desejo a vida simples de um cadáver vivo a completar um sistema doente e ensaiado.

Gritarei um pouco mais por conta do orgulho correndo em minhas veias, forjando tristezas para mim mesmo. Autocomiseração também é uma válvula de escape. O infortúnio coloca tudo em igualdade, e não estamos tão diferentes como no dia anterior. Não nos apropriaremos daquilo que adiamos e até mesmo nossos temores preservam minuciosamente seus calendários. Talvez um dia, veja uma fonte nascer nesse espaço sombrio, sabotado pelos perigos da solidão. Uma fonte que vem estancar minha sede no deserto escaldante da mediocridade que atravesso tão penosamente. Mesmo comparado a um tolo, entendo que cada um é por si mesmo e a vida também é um deserto de individualismos. Essa humildade é mais um modelo a ser imitado do que uma realidade propriamente dita.

Talvez o equilíbrio esteja no "reconhecer", enquanto a arrogância no "não admitir". Admiro a humanidade mas temo seu gênio. Ela é tão falsa quanto a própria falsidade. Dentro das paredes, existe um mundo que não pode ser entendido. Julgue você mesmo o que existe em seu espaço. Sente-se sufocado? Não consegue ser ouvido? Tem medo que exponham sua verdadeira face?

Entendo isso... são as paredes. Elas clamam contra você também. Por lá eu sei como é...

Ouve-se vozes, gritos, palavras sábias de um silêncio mestre, o orgulho sussurra, a cegueira grita e a personalidade se desfigura... chega a hora em que tudo vem ao chão e esse lugar em ruínas é o castelo que a prepotência decide morar. Todos nós dizemos que não, mas, a verdade permanece, aceitemos ou não. Uns decidem se isolar para continuar no poder. Outros, se escondem entre paredes imaginárias repelindo a própria cura. Humildade e arrogância são questões de perspectiva. Desculpe, sei que todo bom raciocínio ofende.

Sei que serei penalizado, mas, é como disse: penalizamos o que não entendemos. Esse jeito de tentar definir a personalidade alheia... isso é outra coisa que não sei definir. Sou um homem calado e estas palavras são vapores que o vento pressionado se encarregará de diluir.

Karlos S Augusto
Enviado por Karlos S Augusto em 12/06/2012
Código do texto: T3720518