PÉS NO CHÃO

PÉS NO CHÃO

Não gosto de flores no jarro d´'agua...Talvez pelo fato de, na infância, semear a terra fofa, acompanhar os brotinhos tenros se espreguiçando ao sol, arteiros, sacudindo suas folhas miúdas e nelas, colher o orvalho deixado pela madrugada amena e me surpreender com o primeiro botão sorrindo - para mim - . agradecido pelo alimento; terra sagrada, água da chuva, vento, brisa, sereno, orvalho...E vê-las, moças alegres, sorridentes, seduzindo borboletas, abelhas, dançando ao sabor do vento. Lembranças infantes correm de pés no chão. Pés no chão; talvez por isso o instinto me grite ao me deparar com a imagem de flores no jarro, afogando-se em água, clamando por terra. Desespero sacrificial, doando a vida muitas vezes por capricho, antecipando sua morte. Não nego a essência, a beleza, o perfume, o enfeite, a harmonia, a nirvanização do ambiente mas é tão breve...

Longe de mim a censura mas toda vez que vejo flores num jarro com água, tenho a sensação de ouvir seus sussurros afogados, derradeiros e chorosos: ao menos devolva-me à terra quando eu não te for mais útil...

Lena Ferreira