Túnel do tempo

Hoje acordei pensando em meu passado, pensando em meus filhos e nas gracinhas que eles faziam. Lembrei-me de objetos que usaram ao longo dos anos: Brinquedos, casaquinhos, colchas de suas caminhas... Era como olhar para um túnel estreito com pequenos fragmentos da história de vida deles. Senti saudade, senti falta de cada uma das fases que viveram comigo. Recém – nascidos macios e cheirosinhos, balbuciando palavras sem sentido, se apoiando nos móveis e batendo os pesinhos gorduchos no chão, andando com perninhas frágeis e caindo com o bumbum de fraldas, primeiro dia na escolinha, o primeiro livro que escreveram, os quadros que pintaram, as lembranças de dia das mães e dos pais (algumas ainda estão guardadas) seus medos e problemas de adaptação, seus amiguinhos e festinhas das quais eram convidados, das festinhas que preparávamos para eles... Tantos fragmentos, meu Deus!

Tudo visto como em um túnel mesmo, um túnel estreito e longo, as lembranças indo em rodopio lento, faltando detalhes... Seus rostinhos inesquecíveis em cada fase... o sorriso, as gargalhadas fazendo eco em minha mente, assim como o choro. As brigas entre eles em que sempre me procuravam como juíza, mas nunca concordavam com meu veredicto...

Os objetos que usaram sumiram junto com o tempo, só restaram alguns lençóis.

Fiquei pensando em como nos livramos sabiamente, embora sem planejar, das coisas. Pensei em como seria se ainda morássemos na casa onde cresceram, como seria difícil ver as coisas que um dia foram importantes, como livros escolares, velhos brinquedos e roupas deixadas para trás, jogadas em algum quarto vazio e empoeirado.

Por força das circunstâncias, ou talvez porque Deus me conheça o bastante para saber que eu sofreria com isso, nos mudamos de casa a cada três anos, às vezes não só de casa, mas de cidade e estado. Então não tivemos apegos e nem raízes. Nenhuma casa pode se dar ao luxo de ter entre suas paredes os ecos do nosso passado, apenas uma parte dele. Também não tivemos coisas duráveis. Nossos móveis na maioria das vezes improvisados se perderam pelo caminho. Não restou nada.

Em nossa casa atual, onde agora não vivem mais as crianças ( que apesar de serem três adultos de quase dois metros de altura ainda são minhas crianças) também não tem mais os objetos que acompanharam a trajetória deles em nossa vida. Acho isso bom, é menos difícil de conviver com a ausência.

Consola-me a idéia de que eles estão se saindo bem em suas vidas.

Vê-los felizes e tranqüilos virou meu sonho de consumo, nada me faz mais feliz, do que ter a certeza de que estão se dando bem na vida. Fico de longe torcendo e orando por eles.

Nada mais posso fazer a não ser isso.

Quando ouço que estão com medo, diante da expectativa de algo novo, de uma nova batalha ou algo que os perturba, também perco o sono e oro. Claro ficar sabendo de suas lutas me deixa nervosa, mais nervosa que deveria, minha posição faz com que os fantasmas fiquem mais assustadores do que realmente são. É como se só eu pudesse protegê-los, é como se só soubessem andar se eu estiver segurando suas mãos. Mas no fundo sei que eles nem precisam de mim. Viram-se e muito bem, mas minha mente não se desliga. Ela permanece pensando que eles precisam da minha proteção e dos meus cuidados.