"La bocca mi baciò..."
Dante situa no Inferno os amantes leitores (Canto V):
"Noi leggiavamo un giorno per diletto
di Lancialotto come amor lo strinse:...
"Quando leggemmo il disïato riso
esser baciato da cotanto amante,
questi, che mai da me non fia diviso,
la bocca mi baciò tutto tremante.
Galeotto fu il libro e chi lo scrisse:
quel giorno piú non vi leggemmo avante."
"Por passatempo eu lia e o meu dileto
De Lanceloto extremos namorados;
Éramos sós, de coração quieto.
Nossos olhos, por vezes encontrados,
Cessam de ler; ao gesto a cor mudara.
Um ponto só deu causa aos nossos fados.
Ao lermos que nos lábios osculara
O desejado riso, o heróico amante,
Este, que mais de mim se não separa,
A boca me beijou todo tremante,
De Galeotto fez o autor e o escrito
Em ler não fomos nesse dia avante".
Tanto lirismo, original e traduzido, não me impedem imaginar uma cena de hoje: ele lê nos olhos dela, no seu corpo, como em livro aberto, página a página, suspiro trás suspiro, pele e pele acariciada em feliz contraponto e resposta a tamanha pergunta... O fado do Amor, enceguecido, ordena leituras inquietas de lábios e cores transmudadas.
NOTA.- O episódio dantesco é suportado, narrativamente, por Francesca de Rimini e Paulo Malatesta, mortos por Gianciotto Malatesta, marido de Francesca e irmão de Paulo, dado que eles tinham ficado apaixonados um/a do/a outra/o, como em tempos recuados Lanceloto e Genevra... Ah, as narrações de cavalarias que o Dante aproveita...