Ande e Entenda
"Meu sonho é entender o porquê dessas comparações, sendo que esta, além de inútil, é uma avaliação subjetiva, uma vez que cada um e à sua maneira criou esse conjunto que é lindo de se ver hoje em dia no skate."
Eis uma manifestação de impaciência de minha parte no mural de um skatista profissional que tenho como amigo no Facebook, depois que ele postou um link sobre uma matéria de um skatista X e uma meia dúzia de bairristas de cérebro de meio quilo aportou com comparações sobre o Y ser melhor, e que ambos só têm tamanho reconhecimento graças a um jogo de videogame.
É de se admirar que em um esporte cuja palavra que permeia todas as categorias, idades e fases de aprendizado é EVOLUÇÃO, alguém surja com tamanha tacanhez de raciocínio, com um pensamento tão subdesenvolvido e digno de torcedor de futebol (não que eu esteja desmerecendo os torcedores, mas o futebol É, por via de regra, um esporte competitivo, e no contexto deles tais discussões são bem válidas, sadias e divertidas. Ou não, já que também podem terminar em pancadarias lindas de se ver pela televisão).
Metade da minha vida é sobre essa tábua com eixos e rodas, e é à ela que eu devo tudo o que eu - espiritualmente falando - possuo: a minha visão aguçada para fotografar banalidades do cotidiano, a minha capacidade de conseguir escrever; foi nela, nessa tábua, que ergui e ainda ergo os meus maiores castelos oníricos (e vi/vejo todos desmoronarem um a um, fazer o quê, né?); é graças ao skate que eu sempre descubro bandas novas, que descubro bandas boas, que a cada vídeo novo surgem ampliando meus horizontes e me proporcionando novas ou ressuscitando velhas sensações - algo que é bem o trabalho da Música, mesmo.
Foi com esse esporte discriminado e concomitantemente descriminado - já que invariavelmente podemos observar em dezenas de propagandas publicitárias e rótulos algum skatista de capacete dando algum aéreo ininteligível de um ângulo mal tirado - que eu aprendi o que é amor e na mesma proporção aprendi o que é ódio; ah, mas como eu ficava putinho da vida ao tentar mil vezes algo simples e nas mil vezes errar... Jogava skate na parede, pro alto, dava urros, esmurrava a cabeça, batia com ela na parede, e muitas vezes ia pra casa chorar no travesseiro, prometendo pra mim mesmo que nunca mais poria os pés de novo naquela merda, pra no dia seguinte estar em cima dela, de novo, tentando a mesma coisa que me fez perder a cabeça no dia anterior.
Já tem doze anos que isso acontece; já tem doze anos que eu respiro skate, que eu saio de casa com ele debaixo do braço pra passar entre carros em vias como Rua Augusta ou Avenida Paulista, já homem feito, barbado, sem vergonha nenhuma de a cada embalada perder um mês de idade; sem vergonha nenhuma de pegar o Metrô com as mãos e as costas e a bunda suja dos tombos; com a roupa imunda e com uma alma tão leve e cândida que só podemos ver algo similar em criancinhas voltando do parquinho abocanhando um algodão-doce.
Esse carrinho formou meu caráter.
E já tem pelo menos quatro anos que eu gostaria de escrever algo relacionado ao meu primeiro e último amor-e-ódio, mas sempre tive um bloqueio filho da puta para tal assunto (tanto é que estou aqui dissertando sem nem saber (e nem querer saber) onde estou querendo chegar).
Bom, o bloqueio chegou.
É... Acho que tudo o que eu queria mesmo é deixar isso registrado, mesmo que de uma maneira pouco coerente, já que começo chutando o pau da barraca e mergulho em memórias e insights.
Ou talvez eu esteja sendo coerente, mas só para quem já experimentou a maravilhosa sensação do vento no rosto e da vida caminhando suave sobre rodas.
Talvez tenha que se andar pelo menos uma vez para entender a profundidade de um amontoado de palavras que possam parecer rasas.
Sei lá.
Talvez eu só esteja querendo indiretamente parabenizar o meu há mais de 20 anos amigo Milso, que fez aniversário no último dia 8, e que anda meio fraco no comparecimento às sessions.
Talvez isso tenha saído por que no dia que ele completou 12 anos de idade eu ganhei meu primeiro skate.
Deve ser.
10/02/2012 - 18h23m