A vida recomeça todo dia( para maiores de trinta)

Quem já passou dos trinta, ou, já cumpriu toda a sequência de eventos culturalmente preestabelecidos; ou...

É, reticências.

Porque não passar por tudo isso (namoro, noivado, casamento, maternidade) deixa uma lacuna que principia a doer e depois vai se estreitando até se tornar um ponto. Um ponto quase imperceptível.

Quase, porque sempre tem alguém apontando o dedo e cobrando o marido, os filhos, os bens, a casa que você não teve. E você mesmo se cobra, porque essa programação sócio-cultural parece natural, biológica. Parece mesmo que todo mundo tem que casar, ter filho e não se separar nunca.

Todos têm que procriar e garantir a manutenção da espécie. Como se ter filho fosse lá grande e inventiva obra humana. Gente, até uma proveta pode ter filho! Exageros à parte é claro que gerar vida é algo sublime, mas a questão não é essa.

A verdade é que os compromissos com os quais nos envolvemos a partir dessas escolhas, de alguma forma, tiram de nós o poder de decidir verdadeiramente o que queremos fazer de nossas vidas, e daí a pouco, estamos cercados de carnês, de três ou quatro pessoinhas que querem de nós simplesmente tudo.

E começa parecer que nunca mais você vai ser só você de novo.

Bem, isso é do lado de lá. Na vida dos casados, aqueles que seguiram o script de suas vidas bem à risca.

Porque do lado de cá, na banda dos solteiros “pervertidos”, dos “subversivos” à marca dos trinta, a banda toca um pouco diferente.

Não que não existam crises entre os solteiros ou que a vida se resuma a uma sequência interminável de baladas, mas se você conseguiu driblar bem a fase de cobranças, do olhar apiedado das matronas na igreja, do falatório suspeitoso sobre sua sexualidade, já que você vive de conversinha com aquele amigo de longa data. É preciso abrir um parêntese aqui (porque para essas pessoas, amizade é uma coisa que só existe quando se é bem jovenzinho...) meu amigo, se você conseguiu passar por tudo isso, ou passa, mas já sabe fazer “ouvido de mercador” aos comentários alheios, você, certamente, está prestes a alcançar o nirvana.

Não o Nirvana, a banda, que mais parecia viver num inferno. O nirvana das escolhas! É. O lugar fora do tempo e do espaço onde você habita. Onde não há horas, nem obrigações a cumprir. Onde você não precisa fazer relatos sobre onde esteve e para onde foi, com quem e por que, como se fosse um adolescente, revivendo uma relação maternal doentia. E sabe que é aí que os casamentos começam a naufragar: a mulher virou mãe, o marido virou filho adolescente que pirraça e contraria a mãe. Não tem como dar certo mesmo.

E não tem conserto, sabe por quê? Quando o rapaz tinha de ser adolescente rebelde, ele estava casando. E quando a mocinha tinha de estar brincando de casinha, ela estava montando uma casa de verdade. E a Psicologia já revelou: uma etapa queimada retornará, inevitavelmente, em algum outro momento da vida.

É aquela velha história: cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é. Pois bem, sejamos felizes com as escolhas que fizemos e com as que virão porque a vida não começa aos 30 ou 40. Ela recomeça todo dia. E lá fora, longe da mediocridade que pode se tornar a vida que forçosamente insistimos em levar, existe outra, cheia de prazer, luz e energia.

Como uma amiga dizia: “não vale a pena montar boneca pros outros brincarem”. É verdade, não vale a pena jogar a vida no lixo para cumprir os rituais de uma tia velha, ou os desejos de uma mãe que queria ter casado na igreja.

A vida até pode se replicar em transcendências ou reencarnações mil. Mas, a vida tal qual conhecemos e sentimos é uma só.

Adelaide Paula
Enviado por Adelaide Paula em 29/11/2011
Código do texto: T3362293
Copyright © 2011. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.