Medo

Quando eu era uma criança, tinha medo do escuro.

Era só a noite chegar e as luzes se apagarem que eu era tomado por um sentimento desesperador que me tornava menor e ainda mais frágil. E eu me encolhia tremulo, embaixo dos lençóis e era nessa hora que aparecia meu pior monstro. Ele ficava junto à porta, me vigiando, imóvel, olhos vermelhos, e a única coisa que eu conseguia ouvir dele era a respiração pesada. E isso era aterrorizador.

Certo dia, já cansado de tanto temer essa situação, decidi enfrentar meu medo. Me levantei, ainda enrolado no lençol, e fui ao encontro do vigiador da porta. Passos lentos, frio no estomago, minhas mãos suadas traduzia o medo que eu sentia. Fui chegando mais perto... mais perto... e quando estava à dois passos do monstro, percebi que ele não passava de uma toalha pendurada na porta. Essa verdade me libertou do meu medo, e a partir de então pude compreender muitas coisas sobre ele.

As pessoas têm medo o tempo todo, mas eu não as culpo por isso, o medo faz parte da vida, é uma sementinha que carregamos dentro de nós e vai se desenvolvendo de acordo com nossas atitudes ao longo da vida.

Existem pessoas que sentem medo do escuro, a escuridão cega, aguça os sentidos e faz com que elas se sentem desprotegidas e sem direção. Outras, ao contrário, têm medo da luz, pois a luz revela quem elas são, faz as mascaras caírem e elas têm medo de mostrar ao mundo a verdadeira identidade que possuem.

Alguns têm medo de atravessar a rua para conhecer novas pessoas, ficam em seus “mundinhos particulares” vivendo uma “vidinha mais ou menos”. Ocupam o tempo de forma que não sobre espaço para ninguém. Vão trabalhar as 06hs:00mn e voltam as 24hs:00mn, são bem-sucedidos profissionalmente, possuem carros do ano, verdadeiras mansões, e usam essas posses para esconder a pobreza interna, a pobreza de sentimentos, de amigos de verdade, os relacionamentos falidos, escondem o medo de dialogar, abrir o coração, enfrentar a realidade e buscar mudança.

Outros vivem em festas, fazem poses para fotos, contam piadas. Possuem uma vida superficial, cheia de ideologias, aparentam uma falsa verdade, uma capa perfeita que esconde toda uma vida de hipocrisia. Quando estão sozinhos, dentro de quatro paredes, longe da agitação, dos fleches, e sorrisos forçados... é nessa hora que o espelho mostra quem realmente são, a dura realidade da alegria passageira, que é fantasiada com alguns drinks, vem a tona, e diante dessa situação elas sentem medo delas próprias.

Será que essas pessoas já pararam para pensar quantas oportunidades, sonhos, sentimentos e pessoas o medo tomou delas? Quantas vezes se sentiram frágeis, pequenas diante das situações, sem saber o que fazer ou para onde ir, alimentando sempre aquela falta de vontade de viver?

Coragem não tem nada haver com a ausência de medo, coragem é a atitude de enfrentar o medo.

É necessário levantar e ir de encontro ao monstro. Os primeiros passos são difíceis, eu sei, eu já passei por isso. Mas quando você chega perto, você enxerga que o monstro nada mais é do que uma toalha pendurada na porta, então nesse momento o mundo se descortina na sua frente, e você passa a olhar a vida com outro sentido.