Ao final



Exposto à luz do sol minguante em uma noite chuvosa, os segredos do passado e do futuro se perdem em meu presente, como se punições divinas me expusessem ao que em realidade sou.
 
Vivo caminhando para a morte, escrevendo continuamente meu epitáfio, deixando para traz o que sou e a vida que experimento, para ser sempre e cada vez mais um ser social, e constantemente me afogo nas lágrimas do viver, como se a vida pudesse ter algum destino que não seja simplesmente o de realizar o nosso ser social e humano, no real e único mundo que temos para viver, no real e único tempo presente que temos para realizar nosso viver.
 
Guardiões da luz e defensores do supremo bem celestial se arvoram a proclamar, como donos da verdade, que o amor é um atributo transcendental e divino, que a felicidade verdadeira ainda virá, em algum lugar fora daqui e em algum tempo diferente deste, e proclamam ainda que a humanidade sem um deus é nada, é perder-se em seus instintos e em sua animalidade.
 
Sinceramente não chego a ter pena deles, por que eles têm a crença no celestial para justificarem suas certezas e suas verdades absolutas, ainda que sem provas, mas tão-somente munidos de sua fé ilimitada. Eu, que vivo buscando entender, o mínimo que seja da natureza, por mais que creia ter provas, sempre duvido dos fenômenos materiais, uma vez que a realidade sempre estará fora de nossa mente. Sou cético pois sou continuamente induzido a crer que a realidade seja tão-somente simbólica, e sou quase levado assim a confundir realidade com idealismo, verdade com interpretação e veracidade com valores.
 
A luz que me ilumina é com certeza a mesma que ilumina a todos, mas o valor que faço dela e a interpretação que dela dou é minha, é única, e pode não estar aderente a realidade que ela traz. A luz em si é transparente, é invisível, a realidade da luz não me é sensível, mas o reflexo dela ou a geração reluzente dela me é perceptiva, e interpretada como real pelo meu circuito neuronal. Não sou melhor do que ninguém, mas também ninguém é melhor do que eu, uma vez que em essência somos todos iguais e em humanidade somos todos irmãos.
 
No final sobram apenas o silêncio da morte, a saudade na mente dos que nos amavam e os exemplos de vida deixados, vida aqui vivida e exemplos aqui deixados.
Arlindo Tavares
Enviado por Arlindo Tavares em 15/10/2011
Código do texto: T3278530
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