O Inesperado...

Fui ao encontro inesperado do silêncio,

ouvi do presente, das lembranças e das saudades,

suscitando-me o longe e o distante que não existe.

No trânsito da vida, vi o farmacêutico, o médico, o padre e o pastor,

a escola, o ginásio, a praça e a casa, minha moradia,

andei em ruas largas do passado que hoje se fizeram estreitas,

vi gente minha que há muito tempo não via.

Lições com minhas professoras Alice e Leonildes tomei,

com a bela menina que se fez Secretária de Estado,

hoje estilista com desenhos próprios, eu bem pequeno estudei.

Ouvi a Banda do Antonio Músico e o saxofone do Pedrinho Enfermeiro.

Passei em frente à Casa Inglesa, Roland Jacob,

das Farmácias Brasil, do Turuca, do Antonio Nascimento e do Lili.

Do velho mercado comi piranhas, traíras e carne verde ou seca ao sol,

do mercado branco, verduras e frutas, deliciando-me com caju, cajuí,

mangas de fiapo, de bico e doce de buriti.

Viajei, em estradas de barro e carroçável,

ao Saco, a Alagoinhas fui na caminhonete do Sr. Júlio,

trafeguei em cima de cargas de caminhões e nos ônibus da Viúva Zezé Paz.

Tornei-me moleque, molecote, tirei ninhos de passarinhos, joguei peteca,

banhei-me na barragem, brinquei nos buracos da pedreira,

pesquei piabas no açude, enchi lingüiça de carne de porco com Romão e Manuel,

comi bode e capote, tripa de porco assadinha, bolo de goma de Seu Janjão,

torreiro de toicim com farinha, carne seca amaciada ao leite e maria izabel.

Entre amiguinhos festejei aniversário de criança,

ganhei presente, soprei balões, cantando fizemos com a felicidade, aliança.

Estive nas festas de Santo Antonio, da Independência da Pátria,

do Natal, do Ano Novo e em todas as outras.

Cantei “Grande é Jeová” num grande Coral de nove componentes.

Fiz teatro, encontrei apóstolos, centuriões, Maria e José,

anjos, pastores e pastorinhas, fadas, rainhas, gata borralheira

e a princesinha que dorme há cem anos.

Pratiquei esporte, dancei pastoril, São João e bumba-meu-boi.

Que susto! Aos nove anos explodi uma dinamite na mão

fazendo todos comigo, mutilados e quase morri.

Na linha do equador, já ao alvorecer, senti um sol quente ao rosto bater.

Em noite calorenta dormi em rede, de água ensopada,

não resfriei, não senti dores nas costas e nem adoeci.

Odiei Sr. Aquiles porque me aplicava injeções,

ao Dr. Miranda porque dos meus dentes fazia extrações.

Como tímido namorei de longe e só eu sabia ou penso que só eu sabia.

Em tudo há um misto de tempo, misturam-se o ontem e o hoje,

porquê no intento de viver intensamente, tudo se faz possível.

Falei à Igreja, falei e me emocionei

e choraram comigo o pranto melancólico e a amizade presente.

Em todos que passei olhei rostos brilhantes de alegria e contentamento

e olhando-me retribuíram amor.

Fizemos aperto de mãos, abraços e beijos,

carinhosamente apertei com força pessoas queridas

que há muito tempo os apropriei como tios, primos e irmãos.

Vivi hoje o ontem da minha infância

e em minha Terra de dias distantes,

ouvi o Silêncio,

vivenciando grandes emoções!

Jatanael Moreira e Silva, em visita a Campo Maior e Teresina - PI

Maceió, 28 de outubro de 1999.

Jatanael Moreira e Silva (in memoriam)
Enviado por Jatanael Moreira e Silva (in memoriam) em 08/09/2011
Código do texto: T3207193