Jornada do viver
O cheiro do hospital veterinário esta impregnado em mim. Meu estomago já demonstra sinais de impaciência para me chamar a atenção.
Estou com uma melodia na memória desde cedo e ela fica de trilha sonora para meus pensamentos e reflexões.
Estou acompanhando mais a fundo a Jornada do Herói e as idas e vindas de nossos personagens queridos e odiados, bem como aqueles que talvez não deram muito certo, e confesso que me incomoda um tanto a idéia que muito de nossa vida e nossos atos revolva a grande questão da morte, seja a de outros ou a nossa.
Lógico que é algo incomodo, desagradável e infelizmente, presente, real. Mas que seja o centro de tudo eu já achava exagero, chapaçao em um único lado.
Mas olhando sob certo aspecto, a verdade é que faz pleno sentido (mais leia que não estou colocando que esta certo ou eu concordo, apenas que é real). Mas não necessariamente do aspecto fatalista, talvez porque sabemos que aconteça, porque não sabemos o que é de fato e isso incomoda.
Vejamos a cena, agora não consigo pensar em nenhuma, mas geralmente isso lembra algo triste, trágico, dramático e muitas vezes fatal. Nós temos tendência a nos concentrar nos aspectos negativos das coisas em geral. Tememos, temos remorsos, tudo isso.
O que me chamou a atenção de forma mais direta, é que voltamos todas as nossas forças para momentos que talvez já não sejam os mais importantes. É uma comparação ruim, mas será o melhor se dar conta da falta de estudo, treino assim que começa a fazer a prova, exame, teste? Não estava pensando tanto no caso de fazer primeiro e pedir desculpas de pois, de medir as conseqüências depois de feita a ação.
A verdade é que muito comum querermos reparar as situações uma vez que nos vemos frente a morte, a nossa ou a da pessoas envolvida na situação pendente. Uma certa forma de que assim ela poderá morrer em paz. Mas será que não era mais ou pelo menos igualmente importante ela viver em paz.
Quer dizer deixar a culpa, a falta de solução a angustia, magoas, raiva, ou qualquer outra coisa durante um período em que incomoda, atrapalha e é carregada e resolver ou quem sabe se livrar quando já não se pode mais fazer muito com ela, ou só porque não se pode fazer muito com ela?
Sim, as vezes queremos aliviar a dor e desconforto de outro, mas talvez o momento seja ate mais doloroso ou pesado para quem acompanha do que para quem apresenta o conflito.
A jornada do herói precisa resolver o conflito, porque assim nos sobrevivemos e podemos nos mostrar fortes, renovados, com conquistas, saber que temos apoio para continuar.
Nem sempre esse tipo de situação se apresenta, pelo menos não de forma direta, e ter tudo ISO no momento do fim é estranho. Mas a verdade é que os humanos tem tendência a romantizar tudo isso, a idolatrar mais a morte do que a vida, a deixar ela como prioridade.
É mais freqüente alguém sair correndo ou voando para alguém que esta em situação de distancia física e espiritual do que para quem esta comemorando ou sofrendo por algo, mas tem boas chances físicas de estar presente no dia seguinte.
Você tem um filme em casa, vai deixar para assisti-lo depois, porque já esta la, porque você pode acesa-lo quando for mais conveniente. Amigos, a vida não pra ser só conveniente, isso é o que você espera do seu advogado, sindico, diretor. Não do seu amigo, companheiro, colega próximo.
As vezes temos uma tendência a conseguir nos aproximar mais facilmente de animais de outras espécies, eles demonstrar maior confiabilidade, são companheiros, eles não arquitetam vingança, não analisam os outros, não descumprem favores, não mentem.
Alguns de nós tem uma tendência de tentar prevenir, ou quem sabe evitar certos desconfortos, mas a realidade é que, como humanos, não temos muito controle sobre quase nada. Não digo que não seja bom tomar certos cuidados, mas que não é bom se apoiar neles como garantias, porque elas não podem ser nada mais do que falsas.
Tentar ser alheio a tudo isso e assim fingir que não acontece, também não resolve. Acontecem as coisas assim mesmo e quem se coloca por fora acaba perdendo a chance de participar, ou participa em não fazer nada para mudar o ciclo. Como resultado, a alienação não gera satisfação, só desconforto. Os problemas continuam ali, só estamos de olhos fechados, e isso vale para as coisas boas também. Não ha escolha sem compromisso.
Mas talvez a vida não seja dura por causa da morte, talvez ela seja complicada porque o ser humano tem dificuldade de lidar com o presente, de sentir e não entender o porque, de respeitar que a realidade não tem um só ponto de vista e que tentar resolver demais as coisas só vai deixá-las cada vez mais distantes.
Não era a intenção deixar isso triste, fatalista e nem um ensaio sobre a verdade, porque assim como nenhum de vocês, eu não a tenho, não quero tê-la. Ter a chance de acordar para ais um dia e ir atrás do que é importante, do que te faz sentir vivo e não prejudicar os outros no caminho, isso pode estar bem perto de ser o suficiente.