VIDA no Arquivo Morto
Hot Water Music é a banda mais intensa que alguém pode ouvir; tanto é que, ouvindo Alright For Now, parei com o arquivo de documentos para arquivar esse pensamento no interior de uma pasta suspensa abandonada. O pior é que voltando a concentração ao trabalho, percebi que havia feito alguma coisa errada. Nada de mais: só coloquei documento da faxineira na pasta da advogada-sócia da empresa.
Adoro esta sala! É o lugar que eu mais me sinto bem nesse prédio, principalmente em dias frios, cinzentos e chuvosos como hoje; dias terríveis para a maioria das pessoas desse País, presumo eu.
Agora toca The Cutter do Echo and The Bunnymen. Não sei se é pela letra ou pelo meio que me levou até essa música – a parte do Rick Howard (que é um dos caras mais chilling nos vídeos de skate) no aclamado Fully Flared – mas, cara, ao ouvi-la minha alma parece ter algum fragmento preso em alguma masmorra do Universo que através da música consegue se libertar e sair voando por entre nuvens de poeira cósmica, desviando de supernovas e transmitindo esse monte de inefáveis sensações de liberdade pra esse esqueleto ambulante que eu sou e que está preso pela própria circunstância de existir apenas e não de plenamente viver... Já se sentiram assim?
Apesar de não parecer, eu ainda sou grato por ter esse monte de terminais nervosos que me permitem sentir o cheiro e o sabor oriundo deste copo de café aqui ao meu lado enquanto ouço a Home, do Edward Sharpe and the Magnetic Zeros, querendo que o sábado chegue logo.
Rise, do Doves... Sobre Doves eu sou meio suspeito pra falar. No meu modo de sentir, na minha idiossincrasia, a sinergia entre esses rapazes de Manchester e o Inverno é impressionante, peculiar; uma abundante fonte de inspirações pra escrever, pensar, sentir. Perambulando por entre as pessoas nessa cidade caótica, levando o vento frio no rosto e ouvindo Doves, ah, eu sou a unificação dos componentes de um petit gateau: posso estar tremendo de frio por fora, mas por dentro estou tão superaquecido quanto o motor de uma locomotiva que vai seguindo seu destino aos solavancos de início, até pegar o ritmo e voar pelos trilhos das gostosas quimeras.
Agora, cara, meu, porra, puta merda: Hot Water Music é imbatível! A Furlan sempre me pergunta afirmando:
“Você gosta mais do Chris, né, nenê?”
Aí eu paro, penso, lembro da God Deciding, da Wayfarer; músicas conduzidas pela furiosa rouquidão do Chuck, e, por fim, me pergunto: “De quem eu gosto mais?”. Mas eu sempre sei a resposta: o Chris sempre se sai soberano - na minha opinião. Sabe esse lance que eu citei da alma voando livre no espaço?
Ele me passou isso no show do The Draft, em 2006... Com que catatonia eu não fiquei diante daquele palco em que ele – como o salvador das almas enclausuradas no Planeta do Embotamento -, como um portal, uma transição via voz e performance, me causava arrepios gélidos na espinha?
Esse cara, esse Chris Wollard, lá de Gainesville, subversivo em No Division; filósofo em At the End of a Gun; piegas e visceral em The Sleeping Fan... Não dá pra viver sem essa banda, sem essa voz que a cada entonada vacilante e alcoolizada faz com que eu me sinta menos humano – sim, MENOS, pois me parece que se é MAIS humano quando se está lutando por ideais de ostentação e disseminando dor e destruição mundo afora; faz com que eu me sinta menos humano e me norteia a encontrar o meu verdadeiro Eu e reconhecer, talvez, esse ideal magnânimo que só parece existir em propaganda de margarina em pelo menos alguns segundos durante algum devaneio despretensioso num dia “feio” como hoje.
Ah, acabaram os documentos pra arquivar e a bateria do MP4 Shing Ling arriou...
Só posso finalizar isso com o último verso de uma música que, desde 2003 (se não me falha a memória), me estremece todos os alicerces do corpo:
NEVER CRY FOR LIVING A EMPTY LIFE!
Sexta-feira 13 do mês de Maio de 2011 – 16h25m