Da amizade (Cidadela)
CIDADELA (1)
Da amizade - V
“Amigo é aquele que não julga. (...) É aquele que abre a porta ao mendigo, à sua muleta, à sua bengala arrumada a um canto. Não lhe peças que dance para julgares como dança. E o mendigo narra a Primavera sobre a estrada lá fora. O amigo é aquele que recebe nele a Primavera. (...)
Fica sabendo que a hospitalidade e a cortesia e a amizade são encontros do homem. Que fazer de um deus que, no templo, discutisse a altura ou a apresentação dos seus fiéis, ou de um amigo que, em casa dele, não aceitasse as minhas muletas e pretendesse que eu dançasse, para me julgar?
Hás de encontrar bastantes juízes por esse mundo afora. Deixa, que de te modelar de outra maneira e de te endurecer, já os teus inimigos se encarregarão. A tempestade não esculpe melhor o cedro. O teu amigo está feito para te acolher. Fica sabendo que, quando vais ao templo, Deus, em vez de te julgar, recebe-te.”
(1) SAIN-EXUPÈRY, Antoine de. Cidadela. 4a. ed. Tradução Ruy Belo. Lisboa: Editorial Aster, 1978. p. 147/148