Do amor e das sociedades frustradas

E lá estava eu, olhando a chuva respingar a cidade pela janela, me deliciando com um cappuccino e divagando acerca de relacionamentos frustrados. Amores contrariados. Destinos descruzados. Essas coisas.

Sabe que no direito societário, uma das causas da dissolução total da sociedade é o exaurimento do objeto social. Ou seja, uma vez esgotado o objeto de determinada sociedade, vale dizer, esgotada sua razão de ser, não há mais razão para continuar a pessoa jurídica.

E eu cá pensando... fazendo uma analogia (meio tosca, é claro) entre a sociedade e o ser humano. Quando entramos em um relacionamento pra valer, mergulhando de ponta e tudo, chutando pra longe a razão e a lógica, acabamos promovendo o ser amado para o centro das atenções e centro das prioridades das nossas vidas. Ou seja, transformamos o imbecil do nosso amor em objeto vital da nossa existência, em nossa razão de ser, em nosso objeto social (isso claro considerando que todas as pessoas do mundo são intensas, passionais e irracionais como eu...).

No momento em que o objeto social é exaurido, ou seja, que chutamos ou somos chutados pelo amor das nossas vidas, não há mais razão para continuar a pessoa física. Assim, de repente, não mais que de repente, se esgota a nossa razão de ser.

Se fôssemos uma sociedade, iríamos à falência total. Acabaríamos. De vez. Algumas pessoas, como o jovem Werther, também.

Daí eu me pergunto: como eu fui capaz de sobreviver a essa dor? Como nós somos capazes? Nós somos muito fortes, implacáveis. A gente fica com o nada dentro de nós e ainda assim conseguimos transformar o nada em razão de viver, conseguimos nos reerguer e buscar novos objetivos. Claro, isso com uma ajudinha do senhor Tempo. Velho sábio. Senhor de respeito.

Mesmo assim, a gente não consegue transformar todo o enorme pedaço de nada em razão de viver. Algum pedacinho sempre fica. E esse pedacinho se chama vazio. Quem sabe um novo amor, ou uma nova possibilidade de amor, não pode nos ajudar nesse aspecto?

A essa altura meu cappuccino já está frio, e a chuva mais esparsa. Mas ela continua a molhar.