Ela só queria
Ela só queria relaxar. Talvez fumar um cigarro escondido, mas a apreensão por fazer algo errado não a deixaria aproveitar o momento. Ainda assim, ela não conseguia ter paz, então resolveu começar a escrever.
Lembrou-se então de seus planos, os quais pareciam bons a princípio, mas, quando verificados com mais seriedade, revelavam-se tortuosos e cheios de viés enfadonhos. Logo quando tudo o que ela deseja é um pouco de tranquilidade para a sua cabeça... Mas ela sabe que para conseguir isso terá de se esforçar pelo menos mais uma vez. Se fracassar muito feio, será obrigada a aceitar seu único destino, destino uma vez sonhado por ela, mas que agora não parece mais fazer muito sentido. Antes ela queria ser mais, superar-se a qualquer custo, e qual caminho seria melhor do que esse? Mas os tempos mudaram e suas ambições também, na verdade diminuíram até tornarem-se escassas. Ela só anseia por segurança e estabilidade agora; nada mais de conquistas gloriosas.
O que ela vê pela frente não lhe parece animador. Uma vida estranha e solitária, uma sombra de si mesma e de sua teimosia. O que ela desejava era ter conseguido se adaptar ao mundo, mas, já que não conseguiu, irá seguir com suas convicções até o fim, visto que sua essência lhe parece imutável. Apenas uma pequena mudança de planos e sua vida se tornará algo mais tolerável e sem muitos riscos.
Sim, ela olha para trás e só consegue identificar um catálogo de erros, seu fracasso como ser humano. Praticamente tudo o que era desejado pela maioria das pessoas ela não conseguia enxergar ou entender, mas reconhecia sua importância no meio, o que a fazia se sentir deslocada. E quando ocorria de ela sentir o que os outros sentem em relação a alguma coisa, ficava tão surpresa que não sabia como lidar com nada disso. E assim seguiam suas frustrações entre o querer e o achar que deveria querer, até que constatou sua incapacidade de se adaptar. Ela simplesmente não quer saber de mais nada e, o que ela quiser, será oculto dos outros, como um presente valioso e inalcançável.
Assim, ela se satisfaz com pouco, já que não deseja nada, e mesmo assim consegue ser voluntariosa e irritante, na ânsia por preencher seu vazio interior. Quando ela pensa que só quer uma vida tranquila, na verdade ela deseja viver, e não apenas sobreviver. E tudo isso apenas a deixa mais e mais frustrada. O que há de errado com ela?