TEMPO DE PERDERMOS AS FOLHAS
O Outono está chegando. Uma estação que tem sua beleza própria. “Estação de se perder folhas”, li esse pensamento na obra “Horizontes e poesias” de Gê Muniz. Achei lindo, muito profundo e pus-me a pensar. “Tempo de se perder folhas...” Na vida sempre perdemos algo. Toda escolha nos leva a uma perda. Se escolhemos isso, perdemos aquilo. Perder faz parte do jogo da vida. Contudo é preciso saber perder. Perder traz uma conotação negativa. Todos querem ganhar. O sistema capitalista e a consciência hedonistas nos prega essa consciência, e como bons filhos do sistema temos isso claro em nossas ações e pensamentos. Contudo abro um convite: que tal olharmos a perda sob uma outra ótica.
Uma árvore quando perde alguns de seus galhos, ganha nova força. O jardineiro sábio em seu ofício, precisa podar as plantas para tê-las mais viçosas e fortes. Os ipês florescem, encantando a vista de quem os admira, porém em breve espaço de tempo perdem todas as suas flores para dar continuidade a espécie. A águia vive muitos anos, mas para atingir sua longevidade passa por uma renovação, perde seu bico, unhas e até as penas. Segundo uma narrativa lendária, mas pedagógica, sofre dores, se isola, passa fome mas, ao final se renova com um novo bico, novas unhas para um novo ciclo de sua vida.
Passamos pela vida acumulando coisas e sentimentos. Nos apegamos aos bens, aos papeis sociais, as profissões, cargos, sentimentos, as relações, as neuroses, aos orgulhos, prepotências, etc. E quanto desses apegos, nos fazem sofrer e nos tiram a paz interior e social.
Outono é tempo de perdemos as folhas. As folhas que nada mais acrescentam a nossa vida. O outono sempre se inicia próximo da quaresma, que assim como a estação, é rica em significado e sentido. Tempo de penitência, de purificação, de preparação para uma festa maior, tempo de renovação, tempo de novas ideias, de nascer de novo. Ser novo homem e nova mulher.
Que possamos aproveitar este tempo para que seja momento oportuno, seja Kairós, para perdermos o rancor, a mágoa, o ódio, a desilusão. Que deixemos cair as tristezas, o orgulho, a mesquinharia, a prepotência, os medos, as relações doentias, enfim tudo aquilo que não nos deixa ser mais.
Em nossa vida, muitas vezes temos de nos resguardar por algum tempo e começar um processo novo de renovação. Que seja o outono que se aproxima e a quaresma que já vivemos, esse tempo da graça. Para que continuemos a voar um voo de vitórias, devemos nos desprender das lembranças, costumes e outras tradições que nos causam dor. Somente livres das folhas mortas, do peso do passado, das vaidades vãs, poderemos aproveitar o resultado valioso que uma renovação sempre traz.
Que o outono nos liberte, o inverno nos fortaleça para que na primavera possamos florir para uma vida mais leve e feliz.