o poeta da noite

Já lhe era o bastante poder usar da força que ainda lhe restava para escrever seus humildes versos. Já lhe era bastante poder viver, quando por muitas vezes desejou a morte. Já lhe era de bom tamanho poder sofrer de amor, se antes, nem isto ele sentia. Pobre é o poeta da noite, que sacia os desejos na luz da lua e da aurora, que sente nos lábios apenas o frio que exala das vielas do centro, e que por fim, só lhe resta à caneta despida de vida e as folhas de papel que se tornam seus pensamentos e sonhos moldáveis.

A cada lagrima, o poeta da noite faz um verso, e de um pranto faz-se toda uma poesia, uma nova e vã fé. Não lhe cessam os pesares e a inspiração com a qual sobrevive pelos cantos e recantos dessa vida. Por designo de coisas que nem ele mesmo conhece, o poeta que conhece os escárnios da vida não vive, apenas sobrevive ás custas de tudo que escreve e vê, e de tudo que nunca viveu.

Os olhos do poeta têm um brilho fosco; as mãos do poeta tocam a realidade e, não conseguindo a aprisionar em si mesmo, á aprisiona em suas rimas que, a muito não conhecem o prazer de algo verdadeiro. Na falta destes tão necessários sentimentos, o poeta inventa os seus próprios sentimentos e se reinventa para não conhecer as próprias magoas, ou simplesmente resguardá-las ate a hora em que ele precise delas. Vai ser assim então para sempre: os mesmos sentimentos grafados em outras rimas e palavras, que por mais diferentes que sejam, parecem querer lhe dizer a mesma coisa.

O poeta da noite um dia já foi como qualquer outra pessoa, mas diante da duvidas foi se sentindo encurralado em seu próprio mundo, ate esquecer que existe este nosso mundo: mais duro que o seu talvez, mas este é real. Pode ser também que, somente o poeta conheça a realidade e sejamos nós que vivemos um sonho, uma perfeita ilusão. De forma que o poeta não se abate tanto com solidão, já que ele passa muito de seus dias a falar desta e de tantas outras coisas que afligem o coração humano. Ele faz dela uma fonte de idéias e pensamentos que acabam por afastá-lo da dor por inteiro. O poeta da noite sofre seus pesares vagarosamente, para que deles se façam muitos versos ou para que, vagaroso também, seja o seu esquecimento.

Felipe de Oliveira Ramos
Enviado por Felipe de Oliveira Ramos em 17/03/2011
Código do texto: T2853101
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