CALÇADA DESERTA
Hoje é quarta-feira, de cinzas.
Foram-se os palhaços,
sobreviveram os cansaços.
Sumiram todas as fantasias
desfilando a última alegria.
Hoje é quarta-feira, de cinzas.
Calaram-se todos os pandeiros
anonimando partideiros.
Dormiram as baterias,
desmancharam-se as alegorias.
Hoje é quarta-feira, de cinzas.
Refugiaram-se os bambas,
pararam todos os sambas
entristecendo-se a avenida com o retorno da vida.
Hoje é quarta-feira, de cinzas.
Lá se foi tão linda aquarela
restando o silêncio da passarela.
Desapareceram as mulatas, as porta-bandeiras
os passistas e as bebedeiras.
Hoje é quarta-feira, de cinzas.
Descansam, fatigados, todos os surdos
Brotam no asfalto milhares de mudos,
convidando cansados foliões
a adormecerem no vazio dos salões . . .
Hoje é quarta-feira, de cinzas.
Sem desfiles e sem arruaça.
Quarta de cinzas,
véspera de um ano
que perdeu toda a graça.