CONSTATAÇÃO

Existem só duas portas: uma de entrada, fortemente vigiada, para o trono e outra de saída, para o deserto. A Corte oferece a escolha. O deserto é a liberdade das idéias, mas a agonia lenta da matéria. E Ela conta com isso. É a sua arma. Saber-nos impotentes é seu grande regozijo. Os alienados lhe são monótonos. Ela precisa de nós para o espetáculo, como nas antigas arenas. Matar-nos uns aos outros para o delírio do grande público. E quanto mais fortes somos, mais servimos ao seu propósito. Porque sabe da nossa consciência de não termos opção. Porque somos centenas entre bilhões. É o gato brincando com o rato. Depois fura-lhe a jugular. É uma estrategista. Ofusca os olhos das multidões com o brilho da pedra sagrada. E, soltando-lhes a corda é que as prendem. E quando todos pensam que estão indo, na verdade, andam em círculos, numa casa de espelhos. Atordoados, não pensam. Bêbados de ilusão, não enxergam. Cegos pela luz, matam em seu nome. São seus soldados, treinados para serem prisioneiros de si mesmos. Fracos, se isolados, mas muitos. E não há possibilidade de reversão.