Neste quarto

Estou em um quarto, creio que já passara da meia noite, ontem foi um dia longo, eu não sai do lugar, permaneci aqui tentando acender essa vela, para ao menos ter uma desculpa de ter a luz perto de mim. Eu não consegui, apelei para a lanterna, a ultima coisa que eu não esperava encontrar nessas gavetas que só vejo jornais. Mas encontrei a pouco tempo. Foi no desespero. Eu não tenho sono, a imobilidade não me cansa, não consigo dormir, eu quero e preciso ver a noite passar, assim como fiz com o dia. Não se trata só do meu querer, existe em mim também, uma insônia absurda que não me permite ao menos fechar os olhos. Do jeito que tudo anda, não preciso fechá-los para ver o escuro, ele, o escuro predomina na minha frente. A pilha é velha. mas resiste. Inacreditavelmente um objeto sem vida é mais forte do que eu que tenho uma. Sou frágil aos meus olhos ou, já fui. Agora nesse meio todo só consigo ver minhas mãos, minha face pode estar diferente. Eu reparei. Ficar sem comer esta me emagrecendo, qualquer um que visse me chamaria de anorexa, mas se não como, não é para perder peso, na verdade não estou comendo porque não acho saudável as coisas que há neste armário, além do mais, a fome ameniza qualquer coisa que eu venha sentir falta. Talvez agora, eu precise de tudo, mas já foi, por enquanto é tarde demais para correr atrás, eu poderia morrer no caminho. Faz pouco tempo que estou neste quarto, venho aqui quase sempre, mas nunca fiquei tanto tempo assim. Se fico é por não ter aonde ir. Quando o mundo incomoda ou eu incomodo o mundo, me escondo aqui. Eu merecia passar o resto da minha vida aqui, nessa prisão, é fácil se aprisionar do que confessar meus crimes e ser presa pelas mãos de outras pessoas. Não! Sou egoísta, eu acho. É que prefiro que ninguém toque em mim, por enquanto. Nem eu quero tocar, só quero esta lanterninha e mais nada. Ah, ia me esquecendo, a pilha também. Esqueço-me da verdadeira identidade que carrego, mas não me importo com ela, meus atos vão compensar mais tarde quem eu fui. Espera que eu diga que foi que eu fiz, não é? Pois bem, vou contar, mas é um segredo. Eu matei! Matei um homem inocente e ignorante por não suportar as coisas que este me dizia. Acha ruim da minha parte? Eu tinha um motivo para fazer isso, não foi por raiva, talvez vingança ou uma simples vontade de matar. Eu não sou assassina, só fui uma vez e agora voltei a ser eu. Matei-o pela seguinte causa. Eu amava outro homem e este que eu matei me estragou os sonhos de ter o meu amado. Eu sabia que conseguiria, bastava um pouco de tática e tempo. O homem não me deixou esperar, ele tentando me ajudar, acabou entregando meus planos para o outro. Outro que aos poucos se aproximava de mim, de uma única vez, rapidamente se distanciou. Então matei, mesmo parecendo injusto. Matei por instinto e por amor. Não me arrependo. Foi até emocionante ver todo aquele sangue. Ninguém sabe que fui eu, nem vão saber, estava tudo armado, arremessei-o no mar. Não faz a menor diferença eu manter esta amizade se eu quero outra coisa que agora não mais posso ter. O homem que eu amo sabe de tudo, não há quem saiba me arrancar o sentido e não tenho amigos, só isso. Confiar em mim já é arriscado, imagina nos demais. Eu vou me calar até que estas palavras saiam de mim em forma de transpiração, vai doer, mas vai acalmar. Enquanto não acalma, permaneço no escuro. E vou permanecer até que o dia amanheça na esperança de ver novamente o sol brilhar.

Ts

Taty Sbrugnara
Enviado por Taty Sbrugnara em 25/11/2010
Reeditado em 25/11/2010
Código do texto: T2636126
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