Agüentar

Cada vez que o ponteiro faz suas 24 voltas o tempo fica menor. Cada vez que o ponteiro faz suas 60 voltas o tempo fica menor. Cada vez que o ponteiro faz suas 1800 voltas o tempo fica menor. Queria ter roubado duzentos beijos seus antes da despedida final. Queria poder ter falado mais, mais, mais, te empanzinado com a minha voz de ogro gago. Sim, eu queria, mas eu não vim aqui falar de paixão, de amor, de relacionamento. Não vim aqui pra falar sobre você. E quem é você? Você é o relógio passando e tirando cada dia um pouco mais da minha essência. Tirando, tirando, tirando e sem colocar nada no lugar. Você é toda a plena implacabilidade do vazio inescrutável, você é a insônia e a azia, você é a ebriedade e a dor de cabeça, você é a descarga de dor que é suscitada no dente aberto e que termina no cérebro, você é a perda de sentido e o ganho de nada, é a negatividade elevada à quinta potência, é... é... é...

Eu não sei o que você é, só sei que eu quero que você DESAPAREÇA! É, é isso, eu quero que você pare de soprar nos meus ouvidos todas as noites que eu sou um lixo, que eu sou merecedor da pior sarjeta do Universo, que eu sou o ser mais inútil num raio de oito galáxias.

Você é o ardil, o maior comensal existente, o pior parasita, o mais sujo e vil, que ataca quando estou sozinho, é, ataca quando a vulnerabilidade me agarra pelo pescoço, a filha da puta cretina desgraçada maldita do caralho, é, dupla de assassinas de alma, pragas, filhas da puta, putas, por que me perseguem?

Eu odeio, odeio, odeio tudo isso. Todo esse monte de nada, todo esse entulho de porra nenhuma, todo esse preenchimento de vácuo, todo esse nadanadanadanada de nada de nada de nada de nada.

Qual é? Por que isso tudo?

Por que não se aninha comigo, pergunta como foi o meu dia, responde as minhas súplicas, cobre as minhas pernas, me faz cafuné, enlaça os dedos nos meus?

Por que só joga balde de água fria na minha cara quando eu estou na melhor parte do sonho?

Por que deixa me paralisado quando eu tenho que me mover? E por que me usa de má fé como um peão babaca no tabuleiro da vida?

Por que você só quer colocar no meu rabo sem passar vaselina e não me explica os motivos de tanta chicotada?

Por quê? Por quê? Por quê? Por quê? Por quê?

Por quê?

Por quê?

Por quê?

Por quê? Por quê? Por quê?

Eu não queria imaginar um fim assim. Eu sempre, sempre me agarro no fim, que o fim e a única certeza, que o fim é inevitável, mas por que o fim é tão doloroso toda vez? E por que o fim é o que parece ser o menos doloroso? Por que o fim parece ser o melhor caminho a ser seguido?

Me enchi desse assunto.

Rafael P Abreu
Enviado por Rafael P Abreu em 08/11/2010
Código do texto: T2603084
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