Tentei Dormir Sozinho

Ao mesmo tempo em que algumas coisas parecem tomar o rumo, outras de força equivalente se dispersam e já não se sabe mais qual o foco; o da fuga ou o da estagnação. Tudo é ambíguo, é sempre o sim e o não medindo forças da mesma forma que o certo e o errado fazem o mesmo. Sento em cima do muro e fico balançando as pernas olhando de um lado para o outro, como o espectador de uma partida de tênis o faz. Quero tanto com quem não quer, querem tanto quando eu não quero e um domo de incerteza me protege da dita felicidade plena. Quero o sol quando faz frio pra me sentir mais alegre Quero o frio quando faz sol pra me sentir mais deprimido. Quero um céu azul pra me enganar e dar uma esperançazinha de que a vida pode ser mais do que uma sucessão de dias de venda e perda de tempo e paciência. Quero as nuvens cinzas, frias, agourentas e carregadas para me emprestar um estado de espírito onde execrar o que há de carregado de negrume dentro de mim é o mais próximo que consigo chegar da felicidade. Quero o vento o frio e o desprezo para serem a bílis que sobe das minhas entranhas e arde tudo, arde a alma e perturba quem a vê exposta aos céus. Eu queria matar quem inventou que amor é felicidade, que são dois corpos, que é um ideal. Depois da bíblia e de Deus e o Diabo deve ser o maior embuste da história da Humanidade e o babaca que pensa saber bastante quando não sabe nada é ciente disso e ainda cai no ardil do tal inefável e único e celestial e divino amor. E sabe que enquanto houver vida dentro de seu corpo e que enquanto houver um coração palpitando e dando a impressão de congelar parcialmente os pêlos do corpo com um arrepio quando se vê o tal alguém-alvo; que enquanto houver um cérebro que trabalha furiosamente o tempo inteiro na criação de fantasias seculares e milenares que outros tiveram, sim, sabe que enquanto esse três fatores existirem ele terá problemas e dualidades. E motivos para continuar escrevendo.

Doves - Cedar Room (É, de novo)

Rafael P Abreu
Enviado por Rafael P Abreu em 26/10/2010
Código do texto: T2578786
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2010. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.