[A Quietude que Eu me Nego]
Emudeço diante da placidez desta casa antiga... Velho alpendre, uma fonte [seca, que pena...] no jardim, árvores velhas, muros cobertos de musgo, a escada unindo o alpendre ao jardim morto — ora, como os sonhos, os jardins também morrem — Ali, a desabitação dos sonhos partidos...
Mas em tudo, a álgida quietude que não tenho: apenas imagino como teria sido belo [e talvez triste] o luar banhando, neste alpendre, o esquecimento de que nada neste mundo nos pertence — nós, seres perdidos de finitude, apenas fazemos mal uso dos empréstimos da vida; sempre queremos mais do que o instante nos dá!
E agora, eu passo, e olho longe... Penso naquele tempo despertencido de mim...
Angustia-me pensar que, certamente, houve aquele luar, aqueles olhares apaixonados, olvidados da fugacidade, da voragem da vida.
Angustia-me a aflição, a loucura de pensar naquele breve instante de alheamento acontecido num alpendre que nunca foi meu... [Certamente esse instante aconteceu — para que mais servem os alpendres que os homens constroem?].
Mas eu, ora... eu sou louco mesmo!
Quem é que me nega a quietude que tanto amo, senão eu mesmo?
Ah, que espanto:
os meus sapatos transportam apenas um corpo;
um corpo povoado por tempos idos...
[São Carlos, 06 de setembro de 2010]