NÁUFRAGO

Mar encapelado

Ondas escuras, e feias

Como o escuro da noite a chorar.

Ondas gigantes de bocarras sem fim.

Balouçar da vida em um fio molhado,

Tétrico, como a solidão do desastre.

E foi-se barco foi-se gente, foi-se vida.

A ventania doía nos ossos... O frio

Regelava a carne nas roupas empapadas.

O mar contorcia-se como um touro bravio.

O medo era bisonho e triste.

No céu não havia estrelas,

Nem luar para tanger uma corda de socorro.

Água salgada e rançosa, com gosto

De peixe vivo e resto de óleo misturado.

A tabua da salvação, onde estará.

E os deuses do mar,

Que estariam fazendo a esta hora?

Hora de abrandar, de ninar o mar.

Prantear, para que, pensar para que?

Morrer ali, junto com as outras almas ululantes.

No escuro da noite,

No verde escuro do mar.