Não tenho vergonha!
Sabe quando se deseja fazer algo e vem uma voz, sabe Deus de onde, te impedindo e dizendo : "Tenho (tenha) vergonha!" A partir de hoje, não serei mais dessa nação. Por que? Oras...
Ter vergonha de fazer aquilo que seu corpo ou seu coração ou seja lá o que for quer fazer por ter "vergonha" é lastimável. Geralmente essa vergonha vem do medo que temos de sermos criticados pelos outros, que nunca chegarão aos nossos pés pelo simples fato de quem alcança meus pés são as minhas mão e não o dedo crítico dos infelizes sacerdotes da vergonha.
Já pensou em gritar para todo o canto do mundo que ama alguém? Ou então que está tão feliz que seus olhos ardem e você chora? Deixei de fazer isso tantas vezes por vergonha. E o que resolveu. Nada... As pessoas continuam com a mesma e incrível capacidade de destruir o que há de mais belo em nós: a gente mesmo.
Seria tão bom se pudéssemos nos destituir de toda a falsa e fina elegância da sociedade e vivermos da forma como sempre pensamos em viver: livres...
Mas descobri que não há liberdade. Descobri também que o que me prende é essa vergonha inútil que nos impede de sairmos nus pela rua, contra o vento ou a favor dele, pelo simples fato de que meu corpo pediu. Quantas vezes calei meu corpo, minha boca, meus pensamentos por vergonha. E o mundo riu de mim. Ou ri, até hoje. E eu? Onde estive no momento em que mais precisei desafiar o mundo que me reprimia num tom si bemol de sarcasmo? Estava calado, num canto, ouvindo os sermões dessa vergonha que me fez calar diante de mim.
Eu quero, daqui pra frente, fazer toda a história que me foi roubada e não me preocupa se uns ou aqueles irão gostar. Pra quê? Os humanos foram feitos para a subversão, mesmo que isso seja, para muitos, a obediência severa e cega das regras feitas para acabarem com os sonhos.
Vamos subeverter o dia com piadas tolas, andar descalço enquanto os olhares nos fuzilam com aquela típica reprovação de quem, durante a vida toda, foi reprovada. E agora só reprova. Por vergonha...
Não tenho muita consciência das coisas, pois isso exige de mim uma seriedade que minha imaginação não é capaz de criar.
Eu vou andar pelo avesso, rir como poucas vezes fui capaz de rir de mim mesmo; cantar alto todas as canções que falam de tudo, sem pudor ou necessidade de castigo.
Quero fumar um narguile com meus amigos sem me preocupar com a essência que a essência tem. Quero beber licor como quem bebe vento e dançar ao som de músicas tão antigas quanto o medo de ser feliz. Quero meus amigos por perto antes da Grande Cortina fechar. Quero dizer que sinto falta deles. Quero dizer que não tenho a vergonha de ser dependente dessa alegria que me contagia.
Quero botar fogo nesse circo, tantas vezes cafona, que se chama vida. Que estar num palco , fazendo canastrices, sem me preocupar com os comentários dos grandes mestres, perguntando-me se não tenho vergonha.
Vergonha?? Já tive. Hoje ela está na estante da sala, empoeirada, escondida e humilhada pelo seu desuso.
Quero ter a volúpia das crianças com sua falta de vergonha, que nos faz corar quando percebemos que somos um bando de marionetes doentes na mão daquilo que sabemos bem o que é.
Talvez um dia eu pague por tudo o que falo e escrevo. Mas a vergonha de ter vivido calado pelo que o seu, ou o meu vizinho diz, essa cicatriz eu não levarei. Jamais.
Vamos dançar? Vamos rir? Vamos celebrar?
Simples assim. Sem a roupa negra e fétida da vergonha pra me impedir de ser feliz!